segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O MINISTÉRIO DE ORAÇÃO POR CURA E LIBERTAÇÃO NA RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA - ALGUMAS CONFUSÕES



Vocês, o povo de Deus, o povo da Renovação Carismática, tenham cuidado para não perder a liberdade que o Espírito Santo vos deu!

O perigo para a Renovação, como costuma dizer sempre o nosso querido padre Raniero Cantalamessa, é a organização excessiva: o perigo de organização excessiva.

Sim, vocês precisam de organização, mas não percam a graça de deixar Deus ser Deus! “No entanto, não há maior liberdade do que deixar-se guiar pelo Espírito, renunciando a calcular e controlar tudo, e permitir que Ele nos ilumine, nos guie, nos oriente, nos impulsione para onde Ele quer. Ele sabe o que é necessário em todas as épocas e em todos os momentos. Isso significa ser misteriosamente fecundo!” (Exortação Evangelii Gaudium, 280).

Um outro perigo é o de tornarem-se “controladores” da graça de Deus. Muitas vezes, os responsáveis (eu gosto mais do nome de “servos”) de algum grupo ou algumas comunidades tornam-se, talvez inconscientemente, os administradores da graça, decidindo quem pode receber a oração da efusão no Espírito e quem não pode. Se alguém faz assim, por favor, não façam mais isso, não faça mais isso! Vocês são dispensadores da graça de Deus, e não controladores! Não imponham uma alfândega ao Espírito Santo!

Papa Francisco, 01 de junho de 2014

 

Introdução


Eu não tenho dúvidas de que os líderes da Renovação Carismática Católica aqui no Brasil não estão nenhum pouco surdos às palavras do Papa Francisco. Por onde olho, vejo irmãos mencionando o discurso do Papa dentro da RCC, o que muito me alegra. Somos um povo obediente à Igreja. Crendo nisto, não faço este artigo num tom de confronto, mas de colaboração.

Este artigo abordará a problemática dos Ministérios na Renovação Carismática Católica do Brasil – de modo introdutório apenas – e se concentrará a fazer frente aos diversos princípios e normas criados dentro do Ministério de Cura e Libertação da RCC aqui no Brasil não pelos coordenadores nacionais, mas pela má interpretação que é feita pelo povo nas bases (dioceses e grupos de oração). Infelizmente, aquilo que deveria ser uma medida pastoral (certos cuidados ensinados nas formações para o ministério) se tornaram dogmas, sentenças ex-cathedra para muitos carismáticos, e isto dá fundamento para proibições e restrições que vão claramente contra alguns princípios claramente evangélicos.

Boa leitura!

O Conceito de Ministério


A palavra ministério, na Bíblia, na maioria das vezes em que aparece, significa serviço. No Novo Testamento a palavra grega para ministério é “diakonia” e indica a prestação de algum tipo de serviço ou trabalho. Como, por exemplo, nesse texto: “e, quanto a nós, nos consagraremos à oração e ao ministério [diakonia] da palavra.” (At 6, 4). Ou seja, eles se dedicariam ao trabalho, ao serviço da pregação da palavra de Deus.

Na Bíblia temos essa palavra aplicada aos vários serviços especiais designados por Deus aos seus servos. Por exemplo, vemos na Bíblia citados o ministério dos levitas, dos sacerdotes, dos profetas, dos apóstolos, etc. (2 Cr 6. 32; At 1. 25).

Tradicionalmente a palavra ministério sempre foi empregada para os ministros ordenados – diáconos, padres e Bispos – motivo pelo qual, aqui no Brasil, quando a Renovação começou a empregar o termo ministério para os diversos serviços e apostolados do Movimento, houve uma orientação para que se abolisse o termo. Assim, a Renovação passou a utilizar, naquele então, o termo secretaria. Tínhamos, por exemplo, a Secretaria Moisés para os intercessores; Secretaria Rafael para os irmãos que oram por cura e libertação, e assim por diante.

Foi quando São João Paulo II escreveu a Encíclica Christifidelis Laici sobre a vocação e a missão dos Leigos na Igreja que a Renovação voltou a adotar, agora sob fundamentação de uma encíclica, o termo ministério para os diversos serviços do Movimento.

Ainda há resistências quanto ao uso deste termo, como também há resistências ao uso da palavra Batismo para descrever a experiência crítica e de sentido que está na base e na identidade da Renovação Carismática. Vamos ilustrar esta questão semântica usando os termos ministério, batismo e Igreja, de modo a ilustrar bem a questão:

Se nós utilizamos a palavra Igreja no seu sentido teológico de Corpo Místico de Cristo, seria errado dizer Igreja Anglicana, Igreja Luterana, etc., porque, neste sentido, a Igreja é Una. Agora, se a palavra é usada no seu sentido etimológico – assembleia, congregação – a palavra está bem empregada.

Quando utilizamos a expressão Batismo no Espírito Santo para definir a nossa experiência carismática fundante, é evidente que estamos utilizando o sentido etimológico e não o sacramental, pois não propomos um segundo batismo sacramental.

Quando utilizamos a palavra Ministério, portanto, utilizamos o mesmo critério etimológico.

“Ministérios Carismáticos” e outros Ministérios


Olhando apenas para a realidade da Renovação Carismática Católica, podemos fazer uma diferenciação básica entre os mais de dez ministérios que, hoje, existem. Quando estamos numa Comunidade Carismática de oração o Senhor dá seus carismas como lhe apraz. Ao receber carismas, o servo recebe a capacitação para exercer um ministério (de acordo com o carisma recebido). O servo recebe a capacitação (esta palavra é importante). O Senhor pode dotar uma única pessoa com o carisma de louvor (música), de pregação e de cura? É claro que sim! Com isto, o servo recebe um revestimento, uma capacitação. No caso deste servo em questão, qual é o seu ministério? Bem... A definição do ministério a ser desempenhado por este servo em questão – que recebeu o carisma do “louvor”, da pregação e da cura – passará por dois crivos:

1.       O Chamado pessoal que Deus faz a este servo em questão.
2.       A confirmação da Comunidade.

Os “ministérios carismáticos” propriamente ditos são:

1.       Ministério de Pregação
2.       Ministério de Cura e Libertação
3.       Ministério de Louvor (referindo-me a música na oração carismática)
4.       Ministério de Intercessão

Estes ministérios supracitados pressupõem a recepção de um carisma. Todos os demais ministérios existentes na Renovação hoje são apenas áreas de atuação ou trabalhos específicos para os diversos estados de vida. Não se recebe um carisma para ser universitário ou profissional. Trata-se de um estado de vida. Não se recebe um carisma para ser jovem; igualmente, trata-se de um estado de vida.

Então, enquanto serviço, podemos utilizar a palavra ministério para os diversos serviços desempenhados na RCC, tal como estamos fazendo? Enquanto serviço, sim. Contudo, os únicos ministérios verdadeiramente carismáticos – no sentido de pressupor a recepção e o exercício de um carisma - são aqueles quatro que citei acima.

De fato, o que faz o Ministério Jovem nas suas reuniões, missões e projetos? Prega, louva, intercede e ministra a cura e a libertação. O que faz o Ministério das Universidades Renovadas? Prega, louva, intercede e ministra a cura e a libertação. E o ministério das Famílias? Idem! O das Religiosas também? Sim... Também!

Faça-se aqui uma pequena ressalva ao Ministério de Formação. Eu não o listei entre os ministérios carismáticos, embora eu acredite no carisma de ensino, porque, na minha opinião, ele merece um certo destaque. Todos estes quatro ministérios carismáticos precisam de irmãos com o carisma de ensino, de modo que eu percebo o serviço do formador dentro de todos os ministérios (é apenas uma questão de ordenamento).

Confusões sobre a pertença a um Ministério


O que devia existir para organizar (os diversos ministérios) acabou por engessar e segmentar demais a Renovação sob muitos aspectos (e esta não é a minha opinião isolada, pois ouvi isto de irmãos notáveis dentro da RCC). Quando percebemos que um jovem universitário não faz formação de pregação, ou de cura e libertação, ou de louvor, ou de intercessão porque “meu ministério é Universidades Renovadas ... Percebemos a verdadeira confusão que há na cabeça do nosso povo!

Recordo-me que, quando eu estava na equipe estadual do Ministério Jovem no Rio Grande do Sul, nós começamos a criar os ministérios de pregação, cura, louvor e intercessão dentro do Ministério Jovem – ou seja, criamos uma Renovação a parte, rsrs. Por outro lado, isto demonstra como percebíamos que, como carismáticos, nosso modo de evangelizar era este: Pregar, Louvar, Interceder e Ministrar a Cura. Nós erramos na solução da questão (criando ministérios dentro do Ministério), mas a intuição era correta.

Portanto, Ministérios com “M” maiúsculo são os quatro já tão repetidamente citados. Todos os servos da Renovação Carismática – não importando se é jovem, universitário, religioso, evangelizador de crianças ou seja lá o que for – deveriam depender formativamente dos Ministérios de Pregação, Cura, Louvor e Intercessão.

Um jovem do Ministério de Universidades Renovadas pode rezar por cura e libertação? Daremos uma resposta mais abrangente sobre este ministério em específico, mas já vamos adiantar e responder aqui: é claro que sim! Pode ministrar louvor? Claro! Interceder? ... Pregar? ... Não somente pode... Deve!

Nós precisamos de ministros da pregação, da cura, do louvor e da intercessão em todos os serviços e estados de vida da Renovação Carismática Católica! Precisamos destes ministros em todos os ministérios!

Recordemos, ainda, que o Espírito Santo distribui seus dons como lhe apraz, de modo que um pregador também pode interceder, ministrar louvor e orar por cura se o Espírito Santo assim lhe capacitar, assim como um intercessor pode pregar! Uma coisa são os dons carismáticos recebidos e outra é o chamado ministerial do servo – embora haja uma profunda conexão entre o carisma e o ministério.

Ainda falando de confusões neste campo, já vi gente negando oração por aí dizendo: “não é o meu ministério”. Realmente... Não é por aí!

Nós somos batizados e crismados. Deus pode nos usar pontualmente em qualquer ministério, porque é Ele quem distribui os carismas como lhe apraz e no momento que lhe apraz. Nem sempre um carisma recebido constituirá um ministério.

Princípios e Normas criados dentro do Ministério de Oração por Cura e Libertação – Desmitificando algumas lendas


Quando o Papa Francisco falou sobre não sermos administradores mas dispensadores da graça de Deus e de “não impormos uma alfândega ao Espírito Santo” a primeira triste realidade que me veio à mente foi a de uma série de princípios e normas criados pela má interpretação, feita nas bases, da formação dada pelo Ministério de oração por Cura e Libertação. Aquilo que deveria ser de caráter pastoral acabou assumindo um caráter quase dogmático, pela rigidez com a qual é aplicado.

Vamos listar algumas regras conhecidas e analisá-las uma a uma:

a)      Só quem é do ministério de oração por cura e libertação pode rezar por cura e libertação (e mais ninguém).
b)      Não se pode encostar na pessoa para fazer oração de cura e libertação e não se pode ficar de pé se a pessoa que recebe a oração está sentada.
c)       Se não estiver recebendo os sacramentos frequentemente, jejuando, rezando o terço e lendo a bíblia... Não pode orar por cura e libertação.

Só quem é do ministério de oração por cura e libertação pode rezar por cura e libertação (e mais ninguém):


A oração por Cura e Libertação é um serviço de suma importância prestado pela Igreja à humanidade. Seu precedente é profundamente bíblico e foi uma profunda característica do ministério do próprio Senhor Jesus.

Enviando toda a Igreja em Missão, Jesus derramou sobre ela o Seu Espírito para que nós – a Igreja – pudéssemos realizar as obras que Ele mesmo realizou, e obras ainda maiores! E Jesus diz claramente que estes sinais acompanhariam aqueles que crerem.

Todo cristão batizado recebeu de Deus o chamado e a Missão de ir pelo mundo inteiro pregando o Evangelho a toda a criatura (não somente os padres, ou um grupo seleto de pessoas); e estes sinais devem acompanhar a pregação de todo cristão batizado (e não apenas de um grupo seleto).

O chamado e o revestimento de autoridade são tão universais que mesmo diante das imensas feridas de divisão presentes no Corpo de Cristo, a pregação dos cristãos, até mesmo daqueles que não estão em comunhão plena com a Igreja, é acompanhada de curas e libertações. Recentemente o Padre José Antonio Fortea, SJ, ao se dirigir à 43º Reunião Anual de Sacerdotes (uma convenção carismática) citou o valioso ministério de cura e libertação dos irmãos separados (citando nomes e escritos).

Sim, estes sinais devem acompanhar a todos os crerem e saírem no anúncio do Evangelho.

Mas como é possível que um evangélico que não reza o terço, não recebe Jesus no Santíssimo Sacramento do Altar e não recebe o sacramento da reconciliação – portanto, que não vive “as cinco pedrinhas” do nosso projeto Amigos de Deus – possa ser usado por Deus para ministrar a cura e a libertação? (Repito: Quem usou o exemplo do ministério de cura e libertação levado a cabo pelos evangélicos numa reunião de Padres não fui eu... Foi simplesmente o Padre Fortea, um dos exorcistas mais renomados da Igreja, autor da obra Suma Demoníaca).

Uma reflexão semelhante a esta foi levantada por Reinaldo Beserra dos Reis no último Encontro Nacional de Reflexão Teológica quando, ao falar do Batismo no Espírito Santo, Reinaldo questiona o fato de que 90% dos nossos escritos apresentam o Batismo no Espírito Santo como um despertar da graça sacramental, o que colocaria em cheque a genuína experiência do Batismo no Espírito Santo nos irmãos separados (e sabemos bem que eles nos precederam historicamente na experiência tal qual a vemos hoje!) e a própria experiência de Cornélio, narrada no livro dos Atos. Reinaldo nos perguntava, então, se o Batismo no Espírito é uma graça de raiz sacramental ou se é uma experiência de oração, deixando claro que sua opinião era a segunda.

Existe, portanto, uma experiência ainda mais básica que toca a todos os cristãos quando falamos do Batismo no Espírito Santo, da recepção dos carismas e do exercício dos ministérios carismáticos. É por isto que, quando refletimos sobre estas realidades, não podemos ser reducionistas. De fato, o Espírito Santo não aceita e não se submete às nossas alfândegas.

É necessário afirmar, então, que orar por cura e libertação é algo que qualquer cristão “poderia fazer” (inclusive cristãos que não estão em plena comunhão com a Igreja Católica).

Alguns podem estar revoltados agora ao lerem estas linhas; alguns, até, estão afirmando: “Então não precisa existir um Ministério de Oração por Cura e Libertação se qualquer cristão poderia rezar”. Não é bem assim ...

Qualquer cristão poderia pregar também. Qualquer cristão poderia interceder. Qualquer cristão poderia louvar (com música ou sem ela). Se de fato recebemos o Espírito de Cristo, participamos de seu múnus sacerdotal, profético e régio e isto nos capacita para que Deus nos use quando e como quiser.

Apesar disto, existem pessoas que são chamadas por Deus a se consagrarem a um ministério e elas recebem, da parte do Senhor, o carisma que as capacita para tal. Aliás, não somente este carisma... Uma única pessoa pode receber vários carismas, mas a um deles Deus fará ser a vocação daquela pessoa. Isto é ser ministeriado.

Só o “ministeriado” pode prestar o serviço do exercício do carisma específico de um determinado ministério? Não! Receber um dom carismático não é o mesmo que receber o sacramento da ordem – que imprime caráter! É por isto, aliás, que eu defendo que todos na Renovação Carismática deveriam receber a formação específica dos Ministérios Carismáticos e não somente os ministeriados, pois o vento sopra onde quer! Se, numa determinada circunstância, é necessário que você pregue... Você não pode dizer: “não, Senhor! Não pregarei porque sou intercessor”. Ou ainda: “Não rezarei pela libertação desta pessoa porque sou apenas ministro de louvor”. Acima do ministério carismático, irmãos, nós somos sacerdotes, profetas e reis pelo Batismo, sacramento este que imprime caráter!

Quando a Renovação Carismática Católica reconhece o chamado ministerial de um grupo de irmãos e lhes concede a capacitação formativa para o exercício do ministério, ela não está criando um grupo de notáveis, os únicos autorizados para exercer este dom carismático. A orientação de que seja sempre um ministeriado, nos nossos grupos de oração, a rezar pelas pessoas é um cuidado pastoral, pelos seguintes motivos:

1.       Se Deus muniu esta pessoa com um chamado para este ministério, é inteligente da nossa parte que seja este servo aquele que exerça o carisma nas nossas reuniões e nos atendimentos. Deus chamou esta pessoa para isto especificamente. É a vocação dela! Não é que os outros não possam... É que Deus chamou esta pessoa!
2.       Atender pessoas, dar aconselhamentos e clamar pela cura e pela libertação de modo responsável exige equilíbrio, sobriedade, discrição, formação e vida cristã comprovada (testemunho). A Renovação Carismática ao reconhecer o chamado do ministro de oração por cura e libertação, constata que ele possui estes pré-requisitos e dá a ele formação. É pelo cuidado pastoral – para evitar desvarios, erros e desequilíbrios que poderiam levar pessoas à perdição – que a Renovação orienta: Que sejam somente os ministros de oração por cura e libertação a rezarem pelas pessoas nos nossos grupos. Trata-se, portanto, de uma medida pastoral.
3.       Quando nos colocamos a rezar por outras pessoas entramos, muitas vezes, em combate espiritual. É um cuidado pastoral sumamente importante que a Renovação zele para que as pessoas que exerçam este serviço/ministério preencham os quesitos citados acima, uma vez que o combate é real e precisamos estar, de fato, revestidos de autoridade para travá-lo. Não é que Deus não possa revestir de autoridade a qualquer cristão, que atue em qualquer ministério, para numa determinada ocasião, ser um instrumento de libertação. É uma questão de inteligência e cuidado pastoral, da nossa parte, priorizar o exercício deste ministério para alguém que é ministeriado.


Não se pode encostar na pessoa para fazer oração de cura e libertação e não se pode ficar de pé se a pessoa que recebe a oração está sentada.


Novamente: Não podemos fazer com que medidas pastorais se tornem dogmas!

Criticava-se a oração de imposição de mãos encostando na cabeça das pessoas porque, segundo alguns, somente um ministro ordenado poderia fazer isto. De fato, esta afirmação não é procedente pelo fato de que é muito diferente aquilo que nós fazemos na Renovação quando oramos pelas pessoas daquilo que um ministro ordenado faz quando confere um sacramento. São níveis totalmente diferentes, e todos na Renovação temos esta consciência!

O senhor Jesus nos ensinou, na parábola do Bom Samaritano, a não ter medo do toque. Aliás, o Evangelho narra inúmeras vezes como Jesus tocava as pessoas. O que não pode haver são confusões neste gesto, misturando imposição de mãos com Heike e filosofias afins. O toque está muito bem fundamentado na Bíblia, de modo que não vejo nem porquê buscar maiores aprofundamentos e gastar mais tempo com este assunto.

Quanto a ficar sentado junto com a pessoa na hora de rezar por ela... É apenas uma medida pastoral. Sentar-se passa a mensagem de que você está no mesmo nível da pessoa, o que fará com que ela se sinta melhor acolhida; ficar de pé para rezar por alguém que se ajoelha ou se senta não é, contudo, necessariamente passar a mensagem de que se é superior à pessoa pela qual rezamos. Trata-se, portanto, de um aconselhamento e não de um dogma. Analisando tempos, momentos e lugares, não há problema algum em rezar de pé para alguém que está sentado.

Se não estiver recebendo os sacramentos frequentemente, jejuando, rezando o terço e lendo a bíblia... Não pode orar por cura e libertação.


Vou retomar um dos parágrafos escritos acima para introduzir este tema:

Mas como é possível que um evangélico que não reza o terço, não recebe Jesus no Santíssimo Sacramento do Altar e não recebe o sacramento da reconciliação – portanto, que não vive “as cinco pedrinhas” do nosso projeto Amigos de Deus – possa ser usado por Deus para ministrar a cura e a libertação? (Repito: Quem usou o exemplo do ministério de cura e libertação levado a cabo pelos evangélicos numa reunião de Padres não fui eu... Foi simplesmente o Padre Fortea, um dos exorcistas mais renomados da Igreja, autor da obra Suma Demoníaca).

Existe, na cultura e na práxis católica em geral, a influência de uma heresia que, na verdade, nunca abandonou o catolicismo: Estou falando do pelagianismo ou voluntarismo. Superficialmente, estas heresias afirmam que a obra da salvação depende de um esforço ascético pessoal e não da graça de Deus. Ninguém em sã consciência, contudo, afirma isto hoje na Igreja Católica. Contudo, na práxis, o pelagianismo segue muito vivo. “Se eu não fizer jejum, abstinência, confissão, e mais uma série de outras práticas espirituais, não estou pronto para pregar, ou interceder, ou ministrar louvor e orar por cura e libertação”. O erro nesta postura é o seguinte:

1.       Não se recebe sacramentos nem se pratica exercícios espirituais diversos porque eles sejam condição para que se possa exercer um ministério. Se recebe sacramentos e se pratica exercícios espirituais para crescer em intimidade com Deus, ser Santo e abrir-se para a graça. Um ministério pode ser exercido até mesmo quando o ministro está em pecado! É por isto que Jesus nos relembra que, naquele dia, virão dizendo: “Senhor, Senhor, mas não foi em teu nome que fizemos milagres?” ao que Ele responderá: “Não vos conheço”.
2.       Por mais exercícios ascéticos que eu e você possamos praticar, nunca seremos dignos de pregar, interceder, ministrar louvor ou orar por cura e libertação. Não praticamos a ascese para nos sentirmos preparados ou dignos (pois nem um milhão de penitências seria capaz de realizar isto em nós). Nossa dignidade e justiça é Cristo!

Pede-se que o servo de Deus esteja em estado de graça, em intimidade profunda com Deus para que, assim, ele seja:

1.       Testemunho daquilo que ele diz e prega
2.       Um canal ainda mais dócil e eficaz para as inspirações do Espírito Santo.

É por causa disto que um cristão evangélico que não recebe os sacramentos regularmente e não pratica os mesmos exercícios espirituais pode, muito bem, ser ministeriado para a cura e a libertação.

Portanto, não se devem apresentar as práticas espirituais como condições, mas como caminhos infalíveis para que o servo de Deus cresça em sabedoria e graça, sendo, assim, um instrumento ainda mais dócil e poderoso nas mãos de Deus. Infelizmente há, até, pessoas que se auto-julgam no direito de avaliar a vida espiritual do outro pela quantidade de práticas espirituais que vê a outra pessoa fazer; pior que isto: há pessoas que se auto-julgam aptas para exercer o ministério por causa da quantidade de práticas espirituais que realizam (e ainda publica aos quatro ventos a quantidade de terços que reza, e todas as práticas espirituais que realiza).

Se alguém acha que eu esteja fazendo apologia contra as práticas espirituais... Simplesmente demonstra a incapacidade de interpretar um texto. Sem ascese nós não chegaremos a lugar algum na vida espiritual e corremos o sério risco da condenação eterna! Não estou, portanto, menosprezando a oração, a devoção mariana, a vida sacramental, a leitura da palavra, o jejum e as demais práticas. De fato, como católico não conheço outros caminhos para manter a chama do Espírito Santo acesa (e não somente isto... Outro caminho para fazê-la crescer e frutificar). Jesus disse que há espécies de demônios que só podem ser expulsos mediante o jejum e a oração. Prescindir disto seria absurdo. O propósito destas linhas não é abolir a necessidade das práticas espirituais – o que, repito, seria um absurdo – mas retificar as intenções que nos levam à prática dos mesmos, colocando as coisas no seu devido lugar.

Conclusão

Não cabe a nós colocar alfândegas para a ação do Espírito Santo.

Eu estou certo de que a Coordenação Nacional do Ministério de Oração por Cura e Libertação não é a responsável pelas confusões que apontei acima – assim como o Conselho Nacional da RCC não é responsável pelos desequilíbrios existentes em muitos grupos de oração que não buscam formação ou que mal interpretam a formação recebida – de modo que estas linhas não se propõem a fazer frente aos nossos formadores no Ministério.

Tenho ciência de que o Ministério de Oração por Cura e Libertação está passando por grandes reformulações, o que é maravilhoso (afinal, somos um corpo vivo e nada pode ficar estagnado). Que estas linhas sejam acolhidas como uma singela contribuição para questões práticas do Ministério.