terça-feira, 31 de março de 2015

INICIAÇÃO CRISTÃ E BATISMO NO ESPÍRITO SANTO



Extraído do livro "Avivar a Chama", dos autores Kilian McDonnell e George Montague - Edições Loyola, 1991


O que o Batismo no Espírito tem a ver com a iniciação cristã?


A Conferência do Coração da Igreja de teólogos e líderes pastorais reuniu-se de 6 a 11 de maio de 1990, em Techny, Illinois, para examinar as consequências pastorais da evidência procedente dos primeiros autores pós-bíblicos de que o Batismo no Espírito Santo é parte integrante da iniciação cristã e é normativo. Os onze autores são: Tertuliano, Hilário de Poitiers, Cirilo de Jerusalém, Basílio, Gregório de Nazianzo, João Crisóstomo, Filoxeno, João de Apaméia, Teodoreto de Cirro, Severo de Antioquia e José Hazaia. Representam as culturas latina, grega e síria, quase toda a costa mediterrânea. Também foi reexaminada a evidência bíblica do Batismo no Espírito Santo.
A Conferência do Coração da Igreja de teólogos e líderes pastorais foi convocada pela Comissão de Serviço Nacional da Renovação Carismática Católica dos EUA, com incentivo da Comissão Ad Hoc dos Bispos da Renovação Carismática para que escrevessem este documento.

Cartas de Incentivo


Diocese de Alexandria
Alexandria, Louisiana

7 de dezembro de 1990

Caros amigos em Cristo:

Em 18 de fevereiro de 1967, um grupo de universitários da Universidade de Duquesne, em Pittsburg, Pensilvânia, num retiro, sentiram, de modo milagroso, o cumprimento de uma promessa divina. Deus, em Seu grande amor, derramou Seu Espírito em um novo momento de graça. Conduziu-os à consciência e ao poder do Batismo no Espírito Santo. Aquilo que haviam conhecido nos sacramentos do Batismo e da Confirmação tornou-se mais vivo e mais real neles.

Este documento (Avivar a Chama) e muitos outros estudos deixam claro que a graça de Pentecostes, conhecida como Batismo no Espírito Santo, não pertence a nenhum movimento particular, mas a toda a Igreja. De fato, não é nada realmente novo, fazendo parte dos desígnios de Deus para Seu povo, desde aquele primeiro Pentecostes em Jerusalém e através de toda a história da Igreja.

Na verdade, na vida e na prática da Igreja, de acordo com os escritos dos Padres da Igreja, esta graça de Pentecostes é considerada normativa para um modo de viver cristão e essencial para a plenitude da iniciação cristã.

Ao divulgar este documento, a Comissão de Serviço Nacional da Renovação Carismática dos EUA almeja dar início a novas reflexões teológicas sobre a questão da graça de Pentecostes, a fim de que as pessoas tenham mais consciência do plano de Deus para todo o Seu povo, e incentivar o aperfeiçoamento de modelos por líderes religiosos pastorais sensatos visando à implementação da premissa fundamental deste documento, isto é, que ser plenamente batizado no Espírito Santo faz parte da vida litúrgica comum da Igreja.

Oxalá Deus, que iniciou esta obra, complete-a conforme Seu desígnio e Seu tempo. A paz

Em Cristo Senhor nosso,

Sam G. Jacobs
Bispo de Alexandria

Diocese de Rockford
Michigan

7 de dezembro de 1990

Queridos amigos,

Avivar a chama veio a público através de um extenso trabalho de consulta. Nossa Comissão Ad hoc para a Renovação Carismática fez a revisão deste documento em duas ocasiões durante o processo de redação. Por solicitação nossa, membros de outras comissões também examinaram este documento. Nossas observações foram levadas em conta e incorporadas ao esquema final. De todo coração, rogamos a nossos irmãos no episcopado que concedam a este documento especial atenção e o difundam em meio às lideranças pastorais de suas dioceses. Acreditamos na força deste documento para o incremento da evangelização e a expansão do Rito de Iniciação Cristã de Adultos. Ele também aborda positivamente a crescente influência das Igrejas Evangélicas em nossos dias.

Agradeço a atenção que dispensarem a esse assunto.

No Senhor Jesus,

Joseph C. McKinney
Bispo de Rockford

...



Avivando a Chama
O que o Batismo no Espírito Santo tem a ver com a iniciação Cristã?


Não estamos presos a nenhum movimento

“Recebestes o Espírito Santo quando abraçastes a fé?” (At 19,2). A essa pergunta de São Paulo, nós, como católicos, respondemos um sincero “sim”, pois nos sacramentos de iniciação recebemos verdadeiramente o Espírito Santo. Contudo, somos convidados a avivar a chama, a reanimar “o dom de Deus” (2Tm 1,6) por meio de uma conversão cada vez mais sincera a Jesus Cristo.

Estamos escrevendo aos bispos e líderes pastorais da Igreja Católica para compartilhar nossa convicção de que o “Batismo no Espírito Santo”, assim chamado pelos escritores cristãos primitivos, é a chave para levarmos uma vida cristã plena. Neste documento, o “Batismo no Espírito Santo” refere-se à iniciação cristã e a seu novo despertar na prática cristã. A Igreja primitiva utiliza o Batismo no Espírito Santo para a iniciação cristã. O emprego desta frase, hoje, para o despertar mais tardio da graça sacramental original não significa, de modo algum, um segundo Batismo. Não estamos sugerindo que o “Batismo no Espírito Santo” acontece apenas na Renovação Carismática, pois a experiência pastoral e a reflexão teológica levam-nos a crer que a graça do “Batismo no Espírito Santo” destina-se a toda a Igreja.

*O emprego generalizado de “Batismo no Espírito Santo” por pentecostais e evangélicos ortodoxos leva alguns católicos a desconfiarem que a frase está ligada ao fundamentalismo. Porém, como ela se encontra nas Escrituras e em autores destacados dos primeiros séculos e é usada em quase todas as igrejas, católicas e protestantes igualmente, onde existe Renovação Carismática, o presente documento opta por mantê-la.

O Batismo no Espírito Santo não se prende a nenhum movimento, quer liberal, quer conservador. Também não se identifica com um único movimento nem com um único estilo de oração, culto ou comunidade. Ao contrário, acreditamos que este dom faz parte da herança cristã de todos os que receberam os sacramentos da Igreja.

Reunimo-nos a convite da Comissão de Serviço Nacional da Renovação Carismática dos EUA, com a confiança e o incentivo da Comissão ad hoc da Renovação Carismática Católica. A vocês oferecemos este relatório para reflexão e discernimento.

A Comunidade enfraquecida precisa de conversão

O trabalho iniciado pelo Concílio Vaticano II é o fonte de esperança e alegria para a toda a Igreja. Desde então, o ressurgimento espiritual inspira e incentiva os fiéis. Entretanto, ainda há muitas áreas que precisam de progresso espiritual e onde o poder do Espírito está fazendo muita falta.

Nossa experiência mostra que o principal motivo de preocupação é a necessidade de uma comunidade evangelizada e evangelizadora (Evangelii nuntiandi 13). Hoje, esta verdade pressiona nossa prática de vida com crescente premência. A desintegração da vida familiar, a diminuição das vocações sacerdotais e religiosas, o consumo esbanjador, o esquecimento dos pobres – esses muitos outros fatores são sintomas do estado de enfraquecimento da comunidade católica que a deixa à mercê das pressões de um mundo temporal, onde os meios de comunicação estão sempre escarnecendo o Evangelho e aviltando a centralidade do valor da pessoa como filha de Deus. Um número cada vez maior de católicos acha difícil viver conforme nossa tradição e os ensinamentos de nossa Igreja. A advertência de São Paulo para que lutemos “contra os Principados, as Potestades, as Dominações deste mundo das trevas” (Ef 6,12) adquiriu um sentido profundamente contemporâneo.

É evidente a necessidade de conversão. A comunidade enfraquecida não proporciona com facilidade o ambiente necessário para as famílias transmitirem a fé à nova geração, nem as vocações necessárias para servirem à Igreja. A comunidade enfraquecida não recupera as grandes perdas sofridas dentro de diversos grupos étnicos atraídos por outros grupos religiosos. A comunidade enfraquecida não traz uma fé vibrante a nossos ritos litúrgicos revistos, nem apóia o tipo de paróquia que favorece a vida no Espírito. Tal comunidade não evangeliza com eficiência, não transmite a fé a seus filhos, não procura alcançar os que se afastaram para, assim, desempenhar sua missão e assumir sua identidade.

A implementação do RICA (Rito da Iniciação Cristã de Adultos) mostra notável convergência de preocupação nessas áreas. Mais precisamente, os recém-iniciados precisam do apoio da comunidade para alimentar a conversão pessoal e eclesial celebrada nos ritos de iniciação. Entretanto, não basta apenas modificar estruturas ou implementar programas. “A Igreja... continua consciente de que ainda as melhores estruturas, ou os sistemas melhor idealizados depressa se tornam desumanos, se... não houver uma conversão do coração e do modo de encarar as coisas naqueles que vivem em tais estruturas ou que as comandam” (EN 36; AAS 29).

Precisamos de uma vida mais profunda no Espírito

Cremos que a solução para esses problemas está em uma profunda conversão pessoal para Cristo, na santificação e em uma vida mais plena no Espírito Santo.

A mensagem de Jesus: “Convertei-vos e crede no Evangelho” está no centro do Evangelho (Mc 1,14; Mt 4,17). A conversão começa no coração, ao enfrentarmos as atitudes, os sentimentos e os hábitos que nos separam do Senhor. A conversão liberta o coração para a influência da perfeição divina encarnada na pessoa de Jesus e partilhada por aqueles cujas vidas assemelham-se à dele. Uma conversão inicial a Cristo consagra-nos a uma vida de discipulado (Lc 9,23-27). Além disso, à proporção que o processo de conversão se desenvolve, transforma as esperanças terrenas e pecaminosas em esperança cristã, as meras percepções humanas da realidade em fé teológica, o amor humano comum em caridade e a busca humana de justiça em construção do reino de Deus na terra (1 Cor 13,13).

A vida de discipulado do cristão convertido faz severas exigências. Requer confiança na providência pessoal de Deus sobre nós, que nos solicita totalmente e nos liberta para partilharmos nossas posses com os pobres e necessitados (Mc 18, 17-31; Mt 20, 16-22; Lc 12, 13-34; 16, 19-31, 18, 18-30). Envolve-nos em uma opção preferencial pelos pobres (Gaudium et Spes 39). Exige o perdão mútuo como o teste fidedigno da oração cristã (Mt 6,12; Lc 11,4). Consagra-nos à vida das bem-aventuranças (Mt 5, 3-12).

A conversão autêntica a Cristo não é nem privativa nem subjetivista. Transcende a piedade sentimental. Acontece em uma comunidade de fé incentivadora, prendendo-nos à tarefa eclesial de edificar o justo reino de Deus na terra.

Uma vida mais plena no Espírito Santo, a unção carismática do Espírito, contempla a Igreja com toda uma amplitude de dons (Lumen gentium, 12). Dons de adoração, louvor e oração aprofundam a dimensão contemplativa da fé cristã. As dádivas de serviço animam uma vida de santidade cristã dedicada à justiça. Todos os carismas trazem nova docilidade ao Espírito, a fé esperançosa na salvadora intervenção de Deus nas questões humanas, acentuado zelo pelo Evangelho e o respeito pela autoridade da Igreja (Declaração Pastoral sobre a RCC – Washington, D.C.: Conferência Católica dos EUA, 1984 – 7, 9, 5-7).

Por meio da experiência contemporânea do Batismo no Espírito Santo, milhões de católicos convertem-se a Cristo e dedicam-se ao serviço da Igreja. São manifestações de um domínio pessoal de iniciação sacramental (Ib., 4-7; 4-6). Como mostraremos a seguir, o Batismo no Espírito Santo inclui a santificação do Espírito e também dos carismáticos. O Batismo no Espírito Santo impregna o culto eucarístico de louvor e adoração. Dá novo sentido ao rito da iniciação cristã. Aumenta o uso devoto da reconciliação e renova ambos os ministérios sacramental e carismático de cura na Igreja. Transforma famílias em comunidades de graça, educando as crianças para a plena maturidade em Cristo (Ib., 10; 7). Dá poderes ao ministério do sacerdócio. Estimula o ecumenismo autêntico.

O Batismo no Espírito Santo inicia os que o recebem em uma experiência de comunidade cristã que transcende tudo o que já conheciam (Ib., 11-13; 7-9). Além disso, a investidura carismática em comunidade dá à Igreja, em todo o mundo, grande número de evangelistas dedicados e eficientes que levam o Evangelho a pessoas e lugares que, de outra maneira, não teriam esperança de ouvir a Boa Nova. Um número significativo daqueles que foram transformados por uma vida convertida no Espírito escolheu servir à Igreja como religiosos e como padres e diáconos. Na verdade, o poder transformador do Batismo no Espírito Santo toca pessoas de todas as idades e de todo o tipo de formação – leigos, padres e bispos.

Reconhecemos que a Renovação Carismática, como o resto da Igreja, tem problemas e dificuldades pastorais. Como no resto da Igreja, temos de lidar com questões de fundamentalismo, autoritarismo, discernimento falho, pessoas que abandonam a Igreja e ecumenismo mal-orientado (Ib., 20-35; 13-18). Essas aberrações originam-se da limitação humana e da pecaminosidade e não da ação autêntica do Espírito. Apesar disso, sua presença na Renovação não impede os católicos do mundo inteiro de experimentarem um autêntico Batismo no Espírito Santo. Quando, portanto, sugerimos que a solução dos problemas descritos acima está, antes de mais nada, em uma profunda conversão pessoal a Cristo, vivida através de uma vida mais cheia do Espírito Santo, referimo-nos ao autêntico domínio da iniciação por meio do Batismo no Espírito.

A iniciação cristã é Batismo no Espírito

Os pentecostais ortodoxos (pentecostais protestantes) não inventaram o Batismo no Espírito. Mais exatamente, ele pertence à integridade da iniciação cristã testemunhada pelo Novo Testamento e pelos primeiros mestres pós-bíblicos da Igreja. Pedro descreve os elementos essenciais da iniciação cristã com estas palavras: “Convertei-vos e cada um peça o Batismo em nome de Jesus Cristo, para conseguir perdão dos pecados. Assim, recebereis o dom do Espírito Santo” (At 2,38). A vida cristã começa com uma conversão na pessoa de Jesus, mas também envolve, essencialmente o dom do Espírito Santo. Todos os quatro Evangelhos apresentam Jesus como aquele “que batiza com o Espírito Santo” (Mc 1,8; Mt 3,11; Lc 3,16; Jo 1,33). O Batismo de Jesus no Jordão é marcado pela descida perceptível do Espírito Santo (Lc 3,22) e se transforma no protótipo de toda iniciação cristã. O dom do Espírito Santo é conseqüência essencial dessa iniciação: “...todos nós fomos batizados em um só Espírito, para formar um só corpo e todos bebemos de um só Espírito” (1 Cor 12,13).

Numerosos são os efeitos deste recebimento do Espírito: santificação (1 Cor 6, 11-19); relacionamento novo e experiencial com Deus pelo qual clamamos “Abba! Papai” (Gl 4,6; Rm 8,15) e com Jesus a quem proclamamos Senhor (1 Cor 12,3); união com os outros no laço da caridade, caminhando no Espírito pelo poder do Espírito (Gl 5, 25); caridade, alegria, paz e os outros frutos do Espírito (Gl 5,22); novo conhecimento dos mistérios de Deus (1 Cor 2,9-15); gosto pela palavra de Deus (Hb 6,4-5); coragem para testemunhar até a morte (At 1,8); discernimento da verdadeira doutrina (1 Jo 2,24-27); e dons de louvor, conhecimento, profecia, cura e outros carismas de serviço para a construção do corpo de Cristo, cada um de acordo com a medida da determinação de Cristo (1 Cor 12,7-11; Ef 4, 7-16). À medida que procuramos esses dons (1 Cor 14,1) e os discernimos (1 Ts 5,19-21), eles nos dão o poder de criar a comunhão que a Igreja deve ser e proclamar ao mundo sua mensagem de amor, justiça e paz. Logo, esta vida no Espírito Santo não é uma espiritualidade entre outras da Igreja. É a espiritualidade da Igreja.

O dom do Espírito que é o infinito amor de Deus (Rm 5,5) nunca pode ser possuído por completo e, por essa razão, deve ser possuído por completo e, por essa razão, deve ser buscado repetidas vezes através da oração (At 4, 23-31); na verdade, às vezes precisa ser reanimado ou reacendido (2 Tm 1, 6-7). Assim, em especial para os que foram batizados na infância, a oração para a completa manifestação do Espírito (a mais recente interpretação do “Batismo no Espírito Santo”) é um meio simples para receber a graça da iniciação cristã. Esse é o padrão e essa é a ordem do Novo Testamento para a vida e o crescimento da Igreja.

O Batismo no Espírito Santo é liturgia pública e é normativo

Como a Igreja primitiva pós-bíblica apossou-se do ensinamento bíblico? O Batismo no Espírito Santo era sinônimo de iniciação cristã em Justino Mártir ( Diálogo com Trifo 29, 1; Patrologia Graeca [PG] 6, 537), Orígenes (Sobre Jeremias 2, 3; Sources Chrétiennes [SC] 232, 244) Dídimo, o Cego (Sobre a Trindade 2, 12; PG 39, 669, 673), e Cirilo de Jerusalém (Palestras Catequéticas 16,6; Cyrilii hierosolymarum archiepiscopi opera quae supersunt omnia [CAO], 2, 213). Tertuliano, Hilário de Poitiers, Cirilo de Jerusalém, João Crisóstomo, João de Apaméia, Filoxeno de Mabugo, Severo de Antioquia e José Hazaia claramente consideravam o recebimento de carismas integrante da iniciação cristã. Hilário, Cirilo e João Crisóstomo receberam o título de doutores da Igreja, sendo reconhecidos como testemunhas competentes para identificar a fé da Igreja. Seu testemunho demonstra que o Batismo no Espírito Santo não é uma questão de devoção particular, mas da liturgia oficial e da vida pública da Igreja. Historicamente, o Batismo no Espírito Santo integra os sacramentos de iniciação, essenciais à Igreja, a saber, Batismo, Confirmação e Eucaristia. Neste sentido, o Batismo no Espírito Santo é normativo.

Durante seu período católico, Tertuliano (c. 160-245) escreveu Sobre o Batismo, que um sábio da estatura de Joahannes Quasten afirma estar “livre de qualquer sinal de montanismo” (Johannes Quasten, Patrology 2, 280). Ao explicar como a Igreja do norte da África havia muito celebrava os ritos de iniciação (Batismo com água, unções, imposição das mãos), Tertuliano diz que a cerimônia da imposição das mãos “convida e acolhe o Espírito Santo” (Sobre o Batismo 8; SC 35,96). A seguir, Tertuliano dirige-se aos recém-batizados que estão para entrar na área onde todos celebrarão a Eucaristia: “Portanto, vós que sois abençoados, por quem a graça de Deus espera, quando sairdes do mais sagrado banho do novo nascimento, quando estenderdes as mãos pela primeira vez na casa de vossa mãe (a Igreja) com vossos irmãos, pedi a vosso Pai, pedi a vosso Senhor, o dom especial de sua herança, a distribuição de carismas, que formam um aspecto básico adicional (do Batismo). ‘Pedi’, diz ele, ‘e recebereis’. De fato, pedistes e vos foi dado” (Ib., 20; SC 35, 96).

Enquanto Tertuliano preocupa-se com a liturgia de iniciação, Hilário de Poitiers (c. 315-367) descreve a experiência em si: “Nós que renascemos pelo sacramento do Batismo sentimos intensa alegria (maximum gaudium) quando sentimos dentro de nós a primeira manifestação do Espírito Santo (Tratado sobre os Salmos 64, 14; Corpus scriptorum ecclesiasticorum latinorum [CSEL] 22, 246). Esta invocação da experiência não é incomum em Hilário. Alhures, ele escreve: “Entre nós não há ninguém que de quando em quando não sinta o dom da graça do Espírito” (Tratado sobre o Salmo 118 12, 4; SC 347,76). Continuando a descrição da iniciação, Hilário escreve sobre as experiências dos carismas: “Começamos a compreender os mistérios da fé, somos capazes de profetizar e de falar com sabedoria. Tornamo-nos firmes na esperança e recebemos os dons da cura...” (Tratado sobre os Salmos 64, 15; CSEL 22, 246). Escreveu isso nos últimos anos de vida. A lembrança de sua experiência de iniciação alguns anos antes, já adulto, ainda o comove.

Para Hilário, os carismas não são ornamentos . Utilizados de modo apropriado, produzem frutos abundantes. “Estes dons penetram-nos como chuva suave. Pouco a pouco, produzem frutos abundantes” (Ib). Hilário está convencido de que os carismas fazem diferença, são eficazes. “Façamos uso de dons tão generoso” (Sobre a Trindade, 2,35; Corpus christianorum 62, 70, 71).

Cirilo de Jerusalém (c. 315-387) deu um conjunto de vinte e três palestras sobre o Batismo. Acha que a Igreja de Jerusalém, como todas as outras, situa-se em uma sucessão carismática, uma história do Espírito iniciada com Moisés. O Espírito é “uma nova espécie de água” (Palestras catequéticas 16, 11; CAO 2, 216). O que o Espírito toca, o Espírito modifica. O Espírito santifica o cristão, transformando o batizado, à semelhança de Cristo.

O Espírito também concede carismas. “Grande, onipotente e admirável é o Espírito Santo nos carismas” (Ib., 16,22; CAO 2, 232). Cirilo não faz nenhuma tentativa de restringir os carismas às ordens clericais. Eremitas, virgens e “todos os leigos” têm carismas (Ib., 16, 22; CAO 2, 234). Cirilo invoca a experiência da Igreja em Jerusalém, em “todo o Império Romano” e no “mundo todo” (Ib). Ao descrever a experiência dos apóstolos em Pentecostes, Cirilo afirma que “eles ficaram completamente batizado” (Ib., 17, 14; CAO 2, 268). “batizados sem faltar nada” (Ib., 17, 15; CAO 2, 269, 270), “batizados em toda a plenitude” (Ib., 17, 18; CAO 2, 272).

Cirilo faz uma idéia geral dos carismas, mas inclui o profético (a luz de Deus sobre o presente). Duas vezes fala sobre a profecia, que é a luz de Deus sobre o presente. “Que cada um se prepare para receber o dom divino (de Profecia)” (Ib 17, 19; CAO 2, 274) e “Deus assegura que vocês são dignos do carisma da profecia” (Ib., 17, 37; CAO 2, 296). Nas últimas instruções antes do começo da iniciação, Cirilo exorta os candidatos: “Meus caros, ao final desta instrução, dirijo-vos palavras de exortação, instando a que prepareis vossas almas para o recebimento dos carismas divinos” (Ib., 18, 32; CAO 2, 334).

Basílio de Cesaréia (c. 330-379) e Gregório de Nazianzo (329-389), que foi bispo de Constantinopla, situam os carismas proféticos dentro da iniciação cristã, embora tenham opiniões mais reservadas do que Paulo (Basílio, Sobre o Espírito Santo, 26, 61; SC 17bis; Basílio, Sobre o Batismo I, 2, 20; SC 357, 169. Gregório de Nazianzo, Quinto Discurso Teológico, 28, 29; SC 250, 332, 334, 336). João Crisóstomo (c. 347-407) representa a liturgia síria em Antioquia, embora ele próprio, como Cirilo, fosse de língua grega. Segundo ele, o modelo da Igreja apostólica incluía o recebimento de carismas dentro da liturgia de iniciação: “Todo aquele que era batizado imediatamente falava em línguas e, não apenas em línguas, pois muitos profetizavam e alguns realizavam muitas outras obras admiráveis” (Sobre 1 Coríntios 29; PG 61, 239). Entre os outros carismas recebidos por ocasião da iniciação na idade apostólica estavam a sabedoria e a cura (Sobre Romanos 14; PG 60, 533). “Em todas as igrejas havia muitos que profetizavam” (Sobre 1 Coríntios 32; PG 61, 265). Entretanto, João Crisóstomo queixou-se: “Há muito os carismas desapareceram” (Sobre 2 Tessalonicenses 4; PG 62, 485). “A Igreja atual é como uma mulher que já passou seus dias favoráveis. Em muitos aspectos, guarda apenas as lembranças da antiga prosperidade” (Sobre 1 Coríntios 36; PG 61, 312-313).

Não apenas escritores das línguas grega e latina, mas também de língua síria, escrevera sobre a transmissão dos carismas dentro dos ritos de iniciação. Filoxeno de Mabugo (c. 440-523) tem uma visão estreita demais da vida cristã e, como muitos de seus contemporâneos, menospreza a possibilidade de perfeição dentro do estado matrimonial. Ele e outros sírios têm uma teologia rigorosamente vinculada à vida monástica. Contudo, mantêm uma teologia antiga, apostólica de verdade, que só mais tarde reduziu-se aos ideais monásticos. Filoxeno fala de dois batismos, um recebido na infância e o segunda, anos mais tarde (Discursos 9, 276; The Discourses of Philoxenus [DB] 2, 265). O que é ilusório porque, na verdade, acredita que “o segundo batismo” é apenas a realização posterior do primeiro. Sobre o primeiro batismo, afirma: “Nosso batismo é o Espírito Santo” (Sobre a morada do Espírito Santo; Sebastian Brock, Syriac Fathers on Prayer and the Spiritual Life 112). Vivendo o Evangelho, “a sensação” da vida divina que recebemos no primeiro batismo, mas que nessa ocasião não sentimos, floresce “na verdadeira experiência do conhecimento do Espírito” no segundo (Ib., 9, 263; DB 2, 254). A experiência traduz-se na verdadeira sensação. Ao escrever sobre o segundo batismo, Filoxeno confunde-se: “Só percebemos o que nos sentimos felizes, mas não saberemos o que essa alegria é” (Ib., 9, 289; DB 2, 277). Ao citar os carismas, é reticente. Não menciona a cura, mas sugere que existem outros carismas além dos que menciona (Carta de Sebastian Brock, Instituo Oriental, Oxford, 27 de maio de 1990, a Kilian McDonnell. Brock também acha que José Hazaia (Abdisho) infere os carismas).

Outros que pertencem à tradição siríaca ou escrevem sobre ela, relacionam os carismas com a iniciação. Como Filoxeno, João de Apaméia (primeira metade do Século V) escreve sobre os dois batismos, o segundo também uma realização posterior do primeiro. No segunda batismo, tomamos posse de modo perfeito “do poder do santo batismo” (João de Apaméia, Diálogos e Tratados, 10, 117; SC 311, 149).Em relação ao segundo batismo, menciona profecia, cura e milagres (Diálogos sobre a alma e as paixões dos homens 9, 10; João, o Solitário, Dialogue sur L’Ânime et lês Passions dês Hommes 34, 35). Teodoreto (c.393 – c.466), por exemplo, atesta o abundante extravasamento de carismas por ocasião da iniciação e menciona a cura em particular (História dos monges na Síria, Prólogo, 8 e 10, SC 234, 138-140). Como João Crisóstomo, Severo de Antioquia (c. 465-538) reconhece que “naquele tempo (apostólico) numerosos carismas foram concedidos aos fiéis e os batizados pelos apóstolos também receberam diversos favores (Sobre a Oração 25; Patrologia orientalis 38, 447). Por último, José Hazaia (nascido c. 710-713), um dos grandes místicos siríacos, escreve sobre o “sinal por meio do qual sentiremos que o Espírito recebido no batismo age em nós”, mencionando “um fluxo de fala espiritual (línguas) e “um conhecimento de ambos os mundos (palavra de conhecimento ou sabedoria)”, além de “alegria, júbilo, exultação, louvor, glorificação, cânticos, hinos, odes...” (A. Mingana, Early Christian Mystics 165-167).

Sebastian Brock, pesquisador de Oxford, afirma que “os padres siríacos não tiveram dificuldade em identificar o batismo cristão com o ‘batismo no Espírito Santo e no fogo’... o batismotambém é um evento carismático” (The Holy Spirit in the Syrian Baptismal Tradition – The Syrian Church Series, 9 – 134). Os padres siríacos estão bem cônscios de que os efeitos pentecostais do batismo não se manifestam necessariamente no próprio batismo, mas podem demorar até mais tarde: entretanto, ‘a promessa do espírito’, o potencial, já está presente, em virtude do batismo... O que Filoxeno diz aqui é algo de grande valor. Examina a relação entre a experiência pessoal de Pentecostes, da vinda do Espírito Santo sobre um indivíduo, e o rito do batismo em si, em um contexto onde, por causa da prática do batismo das crianças, os dois eventos poderão separar-se por muitos anos. O ponto defendido por Filoxeno é que o rito em si confere o dom do Espírito, mas que, como dar também implica receber, é necessário da parte do recipiente um ato consciente de vontade, a aceitação do dom, para que ele sinta de modo apropriado os resultados do dom. Esta aceitação inclui a humildade que o próprio Cristo demonstrou (Fl 2,7): só depois que o ego for desnudado será possível experimentar em plenitude o dom do Espírito. Desse modo, os ‘dois batismos’ são apenas dois aspectos de um único sacramento, o primeiro, visto do ponto de vista do Doador, o segundo do ponto de vista do que recebe – portanto, um único sacramento [não se trata da confirmação] (Ib., 137-139). Na verdade, Brock identificou o ponto onde a teologia siríaca de iniciação cruza-se com a nossa. Como a nossa, a Igreja siríaca praticava o batismo de crianças, com o conseqüente desafio de encontrar um meio para ativar a graça da iniciação na vida adulta. Para os siríacos, o batismo não é acontecimento de um única ocasião. Ao contrário, “o batismo é visto como apenas o começo que abre todos os tipos de possibilidades, desde que a pessoa batizada abra-se à presença do Espírito que nela habita” (Brock, Spirituality in Syriac Tradition 74,77).

Assim, de Cartago, no norte da África, Poitiers, na Gália, Jerusalém, na Palestina e Cesaréia, na Capadócia, de Constantinopla e de Antioquia, Apaméia, Mabugo e Ciro na Síria, temos confirmação do recebimento dos carismas dentro do rito da iniciação. São representantes das tradições litúrgicas latina, grega e siríaca. De Antioquia, Apaméia, Mabugo e Cirro na Síria, temos evidência de uma posse experiencial posterior das graças concedidas na infância.

A concessão dos carismas dentro da iniciação cristã constitui a norma. Todavia, o Espírito é livre para conceder as graças conforme o Espírito deseja. A excessiva focalização desses textos nos carismas desvirtuam o testemunho de seus autores. A vida em Cristo é mais do que apenas carismas proféticos. Na verdade, o amor que o Espírito derrama em nossos corações é de uma ordem mais fundamental do que os carismas. “Se eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, mas não tivesse a caridade, seria um bronze que soa ou um sino que toca” (1 Cor 13,1). A nova água viva do Espírito harmoniza o crente com Cristo, produzindo a santidade, o ardente desejo de Deus, a busca de Deus.

A receptividade aos carismas e ao experiencial no batismo no Espírito não sugere, de modo algum, que a graça seja necessariamente perceptível aos sentidos. Nem propões que o crescimento em Cristo seja progresso de uma experiência do cume de uma montanha para o outro. Muito pelo contrário, leva-se a vida cristã principalmente nos vales. Na verdade, com freqüência, no deserto. A receptividade à experiência é uma coisa, a paixão por elevações espirituais é outra. A busca da experiência religiosa é o caminho mais curto para a ilusão. As sensações e os sentimentos requerem sempre cuidadoso discernimento.

Mais uma vez, aceitar o batismo no Espírito não é juntar-se a um movimento, qualquer movimento. É, isso sim, acolher a plenitude da iniciação cristã, que pertence à Igreja.

O que, então, devemos fazer?

À luz das reflexões anteriores e de nossa experiência do batismo no Espírito e dos carismas desde o Vaticano II, cremos que a retomada do batismo no Espírito Santo pela Igreja promete revitalizar a evangelização, as prédicas, o culto sacramental, o Rito de Iniciação Cristã de adultos, a pastoral de juventude, a preparação para a crisma e modos de vida comunitária no contexto da paróquia local. Fazemos estas sugestões específicas, percebendo que elas não esgotam as preocupações pastorais da Igreja.

A conversão flui da obra de evangelização da Igreja, sua “missão essencial”, sua “mais profunda identidade” e razão de existência (EN 14, AAS 68, 13). Como a conversão, a evangelização é um processo constante, não um evento único na vida do cristão. A conversão leva-nos simultaneamente à “comunhão... com o Pai e com seu Filho, Jesus Cristo” (1 Jo 1,3). “Por meio do que é comum ao Pai e ao Filho, eles desejaram que ficássemos em comunhão entre nós e com eles e, por meio deste dom (a Eucaristia), nos tornássemos um só, para que aquilo que ambos tenham, um só tenha” (Agostinho, Sermão 71, 12, 18; Patrologia latina 38, 454). Por meio das profundezas da comunhão com Deus e na comunhão que é a Igreja, estamos preparados para a participação guiada pelo Espírito na missão da Igreja.

A vida batizada no Espírito é marcada por uma experiência de união dinâmica com Deus e também por uma experiência de carismas doados pelo Espírito. Ambas nos permitem servir a Deus em louvor e adoração, servir uns aos outros na caridade pela profecia, pela cura e por outros dons e desempenhar nossa função no ministério da Igreja. Segundo Karl Rahner, a profecia é “um dom natural permanente da Igreja e uma prova de sua missão sobrenatural” (Visions and Prophecies 102). K. Rahner e H. Vorgrimler dizem que “os carismas, como o múnus e os sacramentos, fazem parte da natureza da Igreja... As formas assumidas pelos carismas... não podem ser previstas, precisamente porque, por sua própria natureza, pertencem à história salvadora da Igreja e, portanto, precisam ser sempre redescobertas e aceitas” (Theological Dictionary 72).

A reconquista do Batismo no Espírito e dos carismas é necessária em todas as instituições eclesiais. As ordens religiosas, as universidades católicas, as associações de fiéis, os movimentos especializados, todos precisam hoje deste toque do Espírito Santo. Na verdade, por meio do Batismo no Espírito Santo e dos carismas, muitos leigos, bem como os padres e bispos, experimentam esta vida mais plena no Espírito. Nós, entretanto, concentramo-nos na paróquia, porque é ali que podem ser abordadas as necessidades da esmagadora maioria de católicos.

Em nossa visão, a paróquia renovada é uma comunidade prestando culto em vibrante liturgia, unida pelo Espírito Santo, servindo uns aos outros, empenhados na conversão e no crescimento contínuos, comunicando-se com os inativos, os irreligiosos e os pobres. Tais paróquias põem-nos em contato com o evangelho e evangelizam nossa cultura. Nessas comunidades, como nos Atos dos Apóstolos e na Igreja primitiva, os carismas do Espírito Santo são identificados e acolhidos com alegria.

A introdução do Batismo no Espírito Santo e dos carismas na vida normal da paróquia exige muita solicitude, sensibilidade, paciência e discernimento. Requer cuidadosamente catequese e senso de oportunidade. Recomendamos que se procurem os conselhos de um pastor experiente. Tudo isso não deve, entretanto, desencorajar os esforços para o Batismo no Espírito e os carismas nem impedir que sejam aceitos na vida da paróquia.

Elemento indispensável em uma paróquia renovada é a contínua conversão nas vidas do pastor e da equipe paroquial. Os líderes pastorais precisam ter não apenas a visão para a paróquia espiritualmente renovada, mas também a experiência pessoal que lhes permita testemunhar e ministrar aos outros a vida do Batismo no Espírito. Isso demonstra a importância vital da formação de seminaristas e da contínua formação espiritual do clero e das equipes paroquiais no Batismo no Espírito.

Outro elemento é a pregação que visa à evangelização. É mais do que a reflexão sobre o texto inspirado e personifica o testemunho pessoal do pregador à ação do Espírito Santo. Tal pregação é instruída pelos dons do Espírito e invoca uma resposta.

O Rito de Iniciação Cristã de Adultos apresenta a realidade da iniciação cristã de uma forma próxima de sua integridade original. É veículo perfeitamente apto para evangelizar os catecúmenos e toda a paróquia, trazendo-os para uma vida plena no Espírito. A chave para isso é a promoção da fé esperançosa que prepara o indivíduo para abraçar com confiança esses elementos de vida no Espírito. Entre a Páscoa e Pentecostes, os recém-batizados e todos os outros paroquianos são levados a sentir a vida no Espírito através de ensinamentos sobre a oração e sobre como receber e utilizar os carismas. Assim, profecia, cura, discernimento de espíritos, oração em línguas e outros carismas entram no fluxo normal da vida paroquial cotidiana (1 Cor 14). Esses dons espirituais, intimamente ligados ao dom do Espírito na iniciação, tornam possíveis as muitas vias de serviço através das quais os paroquianos constroem a comunhão que é a Igreja.

Hoje, um importante componente do ministério para a juventude é a preparação para o sacramento da crisma. Em harmonia com a Constituição sobre a Sagrada Liturgia 71, o Rito de Iniciação Cristã de Adultos e sua adaptação para as crianças em idade catequética, sugerimos que seja salientada a íntima ligação entre a confirmação e a iniciação cristã. Para os já batizados, a preparação para a crisma deve centralizar-se na renovação da vida no Espírito, marcada pela conversão pessoal a Cristo e pela receptividade à pessoa e aos dons do Espírito Santo. Desse modo, a confirmação, como é praticada atualmente, permitiria a renovação da iniciação cristã. O ideal é que a preparação paroquial para a Páscoa, junto com o Rito de Iniciação Cristã de Adultos (Estamos cientes de que, hoje em dia, a escolha da ocasião para a crisma é motivo de discussões acaloradas. Parece-nos que, embora devamos aproveitar ao máximo o momento da confirmação, a fim de incentivar a apropriação do dom do Espírito, não é possível programar com exatidão o momento da graça subjetiva do despertar. Os cristãos devem sempre ser incentivados a dar ao Espírito Santo e aos carismas um lugar maior em suas vidas).

Todos os sacramentos dão oportunidade para a evangelização e a catequese, em especial a Eucaristia, que é a fonte e a culminância de nossas vidas espirituais (Constituição sobre a Igreja, 10). Costuma ser a ocasião para o derramamento do Espírito Santo e de dons como louvor, profecia e cura. “O louvor eucarístico invoca a vinda do Espírito, não apenas sobre as dádivas de pão e vinho, mas também sobre nós, para que nós, nutridos por seu corpo e sangue, possamos ficar cheios de seu Santo Espírito”. Como diz Santo Efrém: “Espírito em teu Pão, Fogo em teu Vinho, milagre sublime que nossos lábios recebem” (Hinos de Fé 10, 7; 154, 34).

A renovação do Batismo no Espírito Santo significa uma nova profundidade em nossa relação pessoal com Jesus como Poderoso Senhor e Salvador enviado pelo Pai no poder do Espírito. “Não se pode negar”, escreve Karl Rahner, “que uma relação pessoal com Jesus Cristo, em íntimo amor, faz parte da existência cristã... Devemos ter em mente que salvação não significa uma coisa enm um acontecimento objetivo, mas sim uma realidade pessoal e ontológica” (Foundations of Christian Faith 308-309).

Embora profundamente pessoal, a vida no Espírito não é individualista, e sim participação no corpo de Cristo. Pastores e equipes pastorais podem promover uma variedade de expressões de comunidade dentro da paróquia. O ponto alto dessas comunidades é o dedicado amor mútuo entre irmãos e irmãs em Cristo.

Dessa experiência de comunhão, os paroquianos são levados pelo Espírito a seus ambientes sociais para dar um testemunho cristão acompanhado de carismas. Esta evangelização inclui testemunho verbal, exemplo de vida e obras de justiça e misericórdia. Como afirmou o Sínodo dos Bispos de 1971: “A ação em nome da justiça e a participação na transformação do mundo parecem-nos inteiramente uma dimensão constitutiva da pregação do Evangelho, ou, em outras palavras, da missão da Igreja para a redenção da raça humana e sua libertação de toda situação de opressão” (De Iustitia in Mundo, Documenta Episcoporum, Acta Apostolicae Sedis 63 [1971] 92,4). Cada uma dessas atividades é uma participação na missão eclesial de evangelização encorajada por Paulo VI no Decreto sobre Atividade Missionário da Igreja (20-21, 30; AAS 68, 18-20, 25, 26).

Para entender por outros grupos cristãos obtêm tanto sucesso em seu proselitismo entre os católicos, precisamos reconhecer um desejo ardente que leva as pessoas a se deixarem influenciar quando lhes é oferecida uma relação mais pessoal com Jesus, uma experiência do poder do Espírito, um culto vibrante e a aceitação em uma comunidade marcada por amoroso interesse pessoal. O melhor antídoto para o proselitismo de outros grupos cristãos entre os católicos é o desenvolvimento de nossa própria evangelização vigorosa e eficiente: a conversão a Cristo e uma vida mais plena no Espírito.

Para os que saíram ou se tornaram inativos, para os irreligiosos e para aqueles milhões que fielmente vêm encontrar a Deus na paróquia renovada, a retomada da iniciação com os carismas, que é o batismo no Espírito Santo, oferece uma significativa oportunidade para a vida em Cristo.

“Se vivemos pelo Espírito, sigamos também o Espírito” (Gl 5, 25).

Em conclusão, todos são chamados a avivar a chama do dom do Espírito Santo recebido nos sacramentos de iniciação. Deus nos dá livremente esta graça, mas ela exige uma resposta pessoal de contínua conversão à Autoridade de Jesus Cristo e receptividade à presença e ao poder transformadores do Espírito Santo. Somente no Espírito Santo a Igreja será capaz de satisfazer suas necessidades pastorais e as necessidades do mundo. O desafio está diante de nós e as conseqüências são claras:

Sem o Espírito Santo, Deus se afasta
Cristo fica no passado,
o Evangelho é letra morta,
a Igreja é mera instituição,
a autoridade é questão de prepotência,
a missão, questão de propaganda,
a liturgia nada mais que uma evocação,
o modo de viver cristão, virtude de escravos.

Mas no Espírito Santo:

o cosmos se reanima e geme com
as dores de nascimento do reino,
o Cristo ali está,
o Evangelho é o poder da vida,
a Igreja manifesta a vida da Trindade,
a autoridade é um serviço de libertação,
a missão é momento comemorativo e também
antecipação,
a ação humana é divinizada.

(Metropolita Ignatios of Latakia, “Palestra sobre o tema principal”, Relatório Uppsala 1968 [Genebra: WWC, 1969] 298).


O Espírito chama cada um de nós em particular e a Igreja como um todo, segundo o modelo de Maria e os Apóstolos reunidos, para aceitar e abraçar o Batismo no Espírito Santo como o poder de transformação pessoal e comunitária, com todas as graças e carismas necessários para a edificação da Igreja e para nossa missão no mundo. Esta missão tem sua origem no Pai estendendo-se por meio do Filho no Espírito, para tocar e transformar a Igreja e o mundo e guiá-los no Espírito por meio de Cristo, de volta ao Pai.

FUNDAMENTAÇÕES BÁSICAS SOBRE A RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA



Texto Oriundo da Renovação Carismática Católica dos Estados Unidos


Introdução

A Renovação Carismática Católica tal qual existe hoje tem como marco histórico um retiro tido em fevereiro de 1967 com alguns estudantes da Universidade de Duquesne. O que aconteceu lá rapidamente se espalhou para alunos graduados e professores da Universidade de Notre Dame e outros que serviam no campo ministerial em Lansing, Michigan. Isso continuou a espalhar-se de tal modo que, depois daquele acontecimento, a Renovação Carismática Católica existe em mais de 238 países no mundo, tendo tocado a mais de 100 milhões de Católicos nestes primeiros 40 anos de existência.

História na Igreja

Os dons carismáticos (línguas, profecia, cura, libertação, etc.) fizeram sua aparição definitiva na vida da Igreja no Domingo de Pentecostes. No livro dos Atos, São Lucas escreve:

“Quando chegou o dia de Pentecostes estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente veio do céu um ruído, como se soprasse um vento impetuoso e encheu toda a casa onde estavam sentados. Apareceram-lhes umas línguas como de fogo que se repartiram e repousaram sobre eles; ficaram todos cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que falassem.” (Atos 2, 1-4).

Por que estas manifestações dos dons carismáticos, tais como as línguas e a profecia, não permaneceram como uma parte normal da vida dos Cristãos ao longo dos séculos? Muitas explicações te sido colocadas. Em “O Batismo no Espírito Santo e a Iniciação Cristã” (e numa versão popular mais curta, inflamando a Chama: O Espírito Santo e a Iniciação Cristã) o Pe. Kilian McDonnell e o Pe. George Montague apresentaram uma explicação. Eles propuseram que os “dons carismáticos” eram uma parte normal da experiência dos sacramentos da Iniciação Cristã e da pública Adoração Litúrgica na Igreja Primitiva. Eles, também, afirmaram que os dons caíram em desuso quando uma larga escala de conversões ao cristianismo acorrida após o Cristianismo tornar-se a Religião Oficial do Império no século III. Muitas pessoas comuns se converteram porque tinham que seguir a seu líder tribal ou político. Então, era difícil para a Igreja catequizar adequadamente estas pessoas para esperar a manifestação dos dons carismáticos em conexão com os sacramentos de Iniciação Cristã.

Dr. Scott Hahn, um professor e biblista popular, propôs outra explicação para a efusão dos dons carismáticos na Igreja Primitiva e no nosso tempo. Numa série de artigos da Revista “New Covenant”, ele apresenta o argumento de que Deus tem concedido um fenômeno pentecostal em várias etapas da história – no Antigo Testamento, na Igreja Primitiva e hoje. Ele afirma que estas manifestações tem sido sinais de misericórdia e do iminente julgamento, primeiro de tudo, àqueles que se encontram fora da aliança e então ao próprio povo rebelde de Deus. Então, ele vê a manifestação dos dons carismáticos dentro do Coração da Igreja Católica como sendo uma grande graça para uma nova onda de evangelização – e uma alerta do juízo iminente se nós não fizermos frutificar esta graça.

Em todo caso, tem havido manifestações destes dons em instâncias isoladas ao longo da História da Igreja, na maioria das vezes, na vida dos santos e de seus seguidores nos movimentos pela renovação da Igreja. Os dons carismáticos, contudo, não havia feito sua aparição em tão larga escala na vida dos Cristãos até estes nossos tempos.

No final do século XIX, se diz que o Papa Leão XIII teve uma visão de Deus permitindo que Satanás tentasse a Igreja durante o século XX; essa visão perturbadora levou-o a compor uma oração a São Miguel Arcanjo. Depois disso, em resposta ao pedido da Beata Elena Guerra (a fundadora das Oblatas do Espírito Santo), o Papa começou o novo século cantando “Veni Creator Spiritus”. Ele também pediu aos Bispos do mundo para que, em comunhão com ele, fizessem a novena ao Espírito Santo pela renovação da Igreja.

Muitos atribuíram esta manifestação dos dons carismáticos como uma resposta de Deus a oração do Papa João XXIII, na preparação do Concílio Vaticano II: “Senhor, renova as tuas maravilhas em nossos dias por meio de um novo Pentecostes”. A Renovação Carismática espalhou-se pela Igreja Católica, primeiramente através dos grupos de oração e “Seminários de Vida no Espírito” (designado para levar as pessoas a uma experiência mais profunda do Espírito Santo).

Em geral, a Igreja tem encorajado a Renovação Carismática, fazendo-a estar sempre firme nos ensinamentos da Igreja e submissa a sua autoridade. No passado, houveram problemas no que diz respeito aos ensinamentos e a autoridade em algumas “comunidades de aliança” associadas à Renovação, mas estes problemas foram direcionados. É importante notar que o foco da Renovação tem sido na conversão pessoal a Jesus e na renovada apreciação da presença do Espírito mais que nos dons carismáticos tão somente. Os dons carismáticos são vistos como meios para evangelizar e guiar o povo a uma relação mais íntima com Jesus.

Em 1969, dois anos depois do marco histórico da Renovação, a Conferência Nacional dos Bispos Católicos (EUA) “reconheceu os bons frutos da renovação.”.

Em 1975, o Papa Paulo VI pessoalmente convidou a renovação a ter uma conferência anual em Roma.

Para maiores informações sobre declarações papais apoiando a na Renovação Carismática na Igreja, nós sugerimos o livro “Abram as janelas: Os Papas e a Renovação Carismática”, editado por Kilian McDonnell (Greenlawn Press).

Seguindo os direcionamentos dos Papas Paulo VI e João Paulo II, os Bispos Católicos de muitos países tem encorajado os esforços da Renovação Carismática enquanto urgem colaboração com as autoridades da Igreja. Os Bispos dos Estados Unidos, em sua carta pastoral de 1984 à Igreja Americana sobre a Renovação Carismática, escreveram: “... a Renovação carismática está enraizada no testemunho da tradição evangélica: Jesus é o Senhor pelo Poder do Espírito para a glória do Pai.”.

Em 1997, os bispos escreveram “encorajai aos que estão na Renovação... a continuar na fiel cooperação com a missão e a visão da Igreja Local aonde eles servem.”.

[As notas acima são tiradas do documento Grace for the New Springtime (Graça para uma Nova Primavera), publicada pelos Bispos da NCCB ad hoc Comitê para Renovação Católica; citados os números 800;235;872 do documento.] Isto é assim porque o Espírito Santo mesmo é o princípio de toda santificação e evangelização que a Renovação Carismática, que enfatiza este fato, contem com tanto potencial para aumentar a efetividade de seu apostolado.

Antes de responder questões de uma assembléia de mais de 100 Bispos e caldeais de todo o mundo, o Cardeal Ratzinger (agora Papa Bento XVI) também se referiu a esta reunião com a Renovação no Espírito:

“Eu tive a alegria e a graça de ver jovens cristãos tocados pelo poder do Espírito Santo... Num tempo de cansaço no qual se fala de um “inverno da Igreja”, o Espírito Santo criou uma Nova Primavera.”

... O desafio hoje não é permitir a fé... Dentro de pequenos grupos, mas tê-lo contemplando a todos e falando a todos. Se nós voltamos à Igreja dos primeiros Séculos, os cristãos eram poucos, mas chamaram a atenção do povo porque não eram um grupo fechado. Eles levavam em desafio geral a todos que tocava a todos.

Hoje nós também temos uma missão universal: Fazer presente a real resposta ao problema de uma vida que corresponde ao Criador. O Evangelho é para todos e os movimentos podem ser de grande ajuda, porque eles tem o impulso missionário dos primeiros tempos, até mesmo na pequenez de seu número, e eles podem dar o ímpeto à vida do evangelho no Mundo. ZENIT990617 (Pontifício Conselho para os Leigos 02/03/2002).

João Paulo II

O Papa João Paulo II deu sempre um grande apoio à Renovação Carismática Católica e encontrou-se dezenas de vezes com os lideres da Renovação para dar encorajamento e direção. João Paulo II, papa por 26 anos, dirigiu-se a grupos Católicos Carismáticos em mais de 25 ocasiões. Ele chamou o movimento “uma força para a Renovação da Igreja”. Em 1979, ele disse aos fiéis: “Eu sempre pertenci a esta renovação no Espírito Santo” (Revista Charisma, 14 de junho de 2005). Neste mesmo ano ele disse aos líderes carismáticos reunidos em Roma: “Estou convencido de que este movimento é um sinal da ação do Espírito... um componente muito importante na renovação de toda a Igreja.” (Open the Windows, pág.26).

Num pronunciamento ao Conselho do ICCRO, dia 14 de março de 1992, o Papa João Paulo II disse: “Neste momento da história da Igreja, a Renovação Carismática pode jogar um grande papel na promoção de uma muito necessária defesa da vida Cristã nas sociedades onde o secularismo e o materialismo têm enfraquecido a habilidades de muitas pessoas para responder ao Espírito e discernir o chamado amoroso de Deus.”.

Em 1996, ele escreveu assim aos Carismáticos: “Como poderíamos deixar de louvar a Deus pelos abundantes frutos que, nas décadas recentes, a Renovação no Espírito tem trazido à vida de comunidades e indivíduos? Um número incontável de pessoas tem vindo a apreciar a importância da Sagrada Escritura para a vivência cristã; eles tem adquirido um novo sentido do valor da oração e uma profunda busca pela santidade. Muitos tem retornado aos sacramentos e um grande número de homens e mulheres tem conquistado um entendimento mais profundo de seu chamado batismal e tem se auto-comprometido à missão da Igreja com admirável dedicação".

Durante uma reunião com mais de 500.000 representantes de vários movimentos da Igreja Católica, na Véspera de Pentecostes de 1998, João Paulo II proclamou: “Abram-se docilmente aos dons do Espírito. Aceitai agradecida e obedientemente os carismas que o Espírito nunca cessa de derramar sobre nós.”.

Numa homilia, em maio de 2004, ele disse: “... Obrigado ao Movimento Carismático, uma multidão de Cristãos, homens e mulheres, jovens e adultos que tem redescoberto Pentecostes como uma realidade viva em sua vida diária. Eu espero que a Espiritualidade de Pentecostes possa espalhar-se na Igreja como um renovado incentivo à oração, à santidade, à comunhão e à proclamação...” (Sábado, 29 de maio de 2004, Véspera de Pentecostes).

Catecismo

No que diz respeito aos dons de Pentecostes, a Igreja faz apropriadas distinções. No Catecismo da Igreja Católica (CIC), a Igreja declara que “a graça é, em primeiro lugar e acima de tudo, o dom do Espírito que nos justifica e santifica” (CIC nº. 2003). A Igreja diz, também, no parágrafo 2003, que as graças são sacramentais – dons próprios dos sacramentos – ou especiais, também chamadas de carismas, segundo a palavra grega empregada por São Paulo e que significa favor, dom gratuito, benefício. Estas são as graças que a Igreja chama de dons extraordinários de profecia, línguas ou outros, mas que estão sempre a serviço da graça sacramental e do bem comum da Igreja.

Referências Bíblicas

Referências das escrituras podem ser encontradas para dar suporte as mais comuns expressões de Católicos Carismáticos...

Intenso Louvor a Deus,

“Aclamai o Senhor por toda a terra. Servi o Senhor com alegria. Vinde, entrai exultantes em sua presença... Entrai cantando sob seus pórticos, vinde aos seus átrios com cânticos; glorificai-o e bendizei o seu nome”. (Salmo 99, 1-4).
“Em coros e danças festivas louvem o seu nome, cantem-lhe salmos com o tambor e com a cítara”. (Salmo 149, 3).
“Solta gritos de alegria, Filha de Sião! Solta gritos de júbilo, ó Israel! Alegra-te e rejubila-te de todo o teu coração, filha de Jerusalém”. (Sof 3, 14).

O Levantar das mãos para o louvor,

“... levanto as mãos para o vosso templo santo”. (Salmo 27,2).
“Assim vos bendirei em toda a minha vida; com minhas mãos erguidas vosso nome adorarei”. (Salmo 62, 5).
“Levantai as mãos para o santuário, e bendizei ao Senhor”. (Salmo 133, 2).

O Bater das palmas,

“Povos, aplaudi com as mãos, aclamai a Deus com vozes alegres”. (Salmo 46, 2)

Falar em Línguas,

“Estando Pedro ainda a falar, o Espírito Santo desceu sobre todos os que ouviam a palavra. Os fiéis da circuncisão, que tinham vindo com Pedro, profundamente se admiraram, vendo que o dom do Espírito Santo era derramado também sobre os pagãos; pois eles os ouviam falar em outras línguas e glorificar a Deus”. (Atos 10, 44-46).
“E quando Paulo lhes impôs as mãos, o Espírito Santo desceu sobre eles, e falavam em línguas estranhas e profetizavam”. (Atos 19, 6).
“Outrossim, o Espírito vem em auxílio à nossa fraqueza; porque não sabemos o que devemos pedir, nem orar como convém, mas o Espírito mesmo intercede por nós com gemidos inefáveis. E aquele que perscruta os corações sabe o que deseja o Espírito, o qual intercede pelos santos, segundo Deus”. (Rom 8, 26-27).
“Assim, pois, irmãos, aspirai ao dom de profetizar; porém, não impeçais falar em línguas. Mas faça-se tudo com dignidade e ordem”. (I Cor 14, 39-40).

Outras Características em Geral:

“Estes milagres acompanharão os que crerem: expulsarão os demônios em meu nome, falarão novas línguas, manusearão serpentes e, se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal; imporão as mãos aos enfermos e eles ficarão curados” (Mc 16, 17-18).
“A respeito dos dons espirituais, irmãos, não quero que vivais na ignorância” (I Cor 12, 1).
“Há diversidade de dons, mas um só Espírito. Os ministérios são diversos, mas um só é o Senhor. Há também diversas operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. A cada um é dada a manifestação do Espírito para proveito comum. A um é dada pelo Espírito uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de ciência, por esse mesmo Espírito; a outro, a fé, pelo mesmo Espírito; a outro, a graça de curar as doenças, no mesmo Espírito; a outro, o dom de milagres; a outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, a variedade de línguas; a outro, por fim, a interpretação das línguas. Mas um e o mesmo Espírito distribuiu todos estes dons, repartindo a cada um como lhe apraz”. (I Cor 12, 4-11).


Conclusão

Se olharmos para a Renovação Carismática à luz do que acabamos de ler, veremos que o movimento do Espírito trabalha dentro da Igreja de com Sua vontade e com a cooperação dos fiéis. A Renovação Carismática mesma não é originária de uma necessidade de informar a Igreja Universal a respeito dons do Espírito Santo e sua cooperação com eles, mas dá necessidade entre seus membros de um melhor entendimento do que estes dons são. Ao mesmo tempo, o movimento reclama a subordinação dos dons carismáticos àqueles dadas pelos sacramentos – especificamente, os sete dons do Espírito Santo, como consta no livro do Profeta Isaías 11, 2-3, dados a cada cristão no batismo e avivados na Confirmação.

Sobre o que tem sido dito acerca dos dons carismáticos, o fato de que eles são derramados sobre a Igreja pelo Espírito Santo para a edificação do Corpo Místico de Cristo, é claro que eles não podem ser fonte de divisão, mas, muito pelo contrário, servem para fortalecer a unidade cristã. Mais ainda, um dos principais efeitos de uma intimidade com o Espírito Santo é de uma profunda humildade. Sendo assim, é importante distinguir entre o comportamento de pessoas individuais e a Renovação Carismática como um todo.

ESCLARECIMENTOS À CNBB SOBRE ALGUNS ASPECTOS DA RCC




Dom Alberto Taveira fala da oração em línguas, repouso no Espírito e inspirações particulares



Em nome da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, sou o Assistente Espiritual do Conselho Nacional da Renovação Carismática Católica, um dos mais significativos Movimentos Eclesiais existentes em nosso tempo. Algumas interrogações me foram feitas por Dom Rafael Llano Cifuentes, Bispo de Nova Friburgo-RJ, proporcionando-me levar ao Conselho Permanente da CNBB alguns esclarecimentos, que podem servir a tantos irmãos e irmãos da RCC ou que desejam conhecê-la mais de perto. Eis o texto escrito que apresentei à 58ª Reunião do Conselho Permanente da CNBB:

Esclarecimentos sobre alguns pontos da RCC

Foi-me pedido para fazer uma breve comunicação a respeito de alguns pontos sobre a Renovação Carismática Católica. Escolhi dois caminhos, sendo o primeiro uma consulta feita aos coordenadores nacionais da RCC, aos quais encaminhei as perguntas feitas, com respostas que me foram apresentadas por Reinaldo Beserra, do Escritório Nacional da RCC e membro do Conselho Internacional da RCC – (ICCRS). Tais respostas correspondem e são plenamente assumidas por mim, por corresponderem ao que penso e às orientações que costumo oferecer à RCC. Em seguida, desejo apresentar algumas propostas.

I – Esclarecimentos solicitados pelo CONSEP, a pedido de Dom Rafael:

1. "Benefícios" da oração em línguas: Os carismas, sejam extraordinários ou humildes, são graças do Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial, ordenados como são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo. Carismas são "manifestações do Espírito para proveito comum". São dons úteis, instrumentos de ação, para servir à comunidade.

Conceituação:

a) "É um dom de oração cujo valor, enquanto 'linguagem de louvor', não depende do fato de que um lingüista possa ou não identificá-lo como linguagem no sentido corrente do termo". É uma linguagem a-conceitual, que se "assemelha" às línguas conceituais. Não supõe absolutamente um estado de "transe" para praticá-la, não corresponde a um estado "extático", e nem a uma exagerada emoção, permanecendo aquele que a pratica no total domínio de si mesmo e de suas emoções, pois o Espírito Santo jamais se apossa de alguém de modo a anular-lhe a personalidade.

b) É um dom que leva os fiéis a glorificar a Deus em uma linguagem não convencional, inspirada pelo Espírito Santo. É uma forma de louvar a Deus e uma real maneira de se falar e se entreter com Ele. Quando o homem está de tal maneira repleto do amor de Deus que a própria língua e as demais formas comuns de se expressar se revelam como que insuficientes, dá plena liberdade à inspiração do Espírito, de modo a "falar uma língua" que só Deus entende.

2. O "falar em línguas", consignado nas Escrituras comporta três modalidades:

a) a oração em línguas, de caráter usualmente particular, pessoal, e que portanto não requer interpretação. Embora de caráter pessoal, ela pode ser exercitada também de modo coletivo, o que acontece nas assembleias onde todos exercem o "dom particular de orar em línguas", ao mesmo tempo; obviamente, não supõe interpretação. No entanto, Deus – que ouve a oração que milhares de fiéis lhe dirigem concomitantemente de todos os cantos da Terra – por certo entende. Vale a intenção que está em nosso coração.

b) Essa oração também pode ser expressa em modalidade de canto, uma oração com uma melodia que não foi pré-estabelecida. Também essa modalidade não requer interpretação. A diferença em relação à modalidade anterior, é que aqui se trata de orar em línguas, mas num ritmo não falado, de expressão e cadência musical, de notas que se sucedem improvisadamente, numa modulação lírica com que se celebra as maravilhas de Deus. São cânticos que brotam geralmente nos momentos de louvor e adoração da assembléia, do grupo de oração, e que pouco tem em comum com os cânticos eclesiásticos tradicionais, ou também com os cantos de "composição artística". Santo Agostinho, comentando as palavras do Salmo "Cantai ao Senhor um Cântico novo", adverte que o cântico novo não é coisa "de homens velhos". "Aprendem-no os homens novos, renovados da velhice por meio da graça, pertencentes ao Novo Testamento, que já é o Reino dos Céus. Por ele manifestamos todo o nosso amor e lhe cantamos um canto novo. Quando podes oferecer-lhe tamanha competência que não desagrade a ouvidos tão apurados?... Não busques palavras, como se pudesses dar forma a um canto que agrade a Deus. Canta com júbilo! Que significa cantar com júbilo? Entender sem poder explicar com palavras o que se canta com o coração. Se não podes dizer com tuas palavras, tampouco podes calar-te. Então, resta-te cantar com júbilo, se modo que te entregues a uma alegria sem palavras e a alegria se dilate no júbilo" .

c) Uma terceira modalidade do dom das línguas é aquela de uso essencialmente público, que quando é acompanhado do seu complemento, o dom da interpretação, tem como seu propósito a edificação dos fiéis e a convicção dos descrentes. Aqui o falar em línguas não assume o caráter de oração, mas de uma mensagem em línguas, dirigida à assembléia e não a Deus, como é o caso da oração, e que portanto requer o exercício do outro dom apontado por Paulo, o dom da interpretação. O Espírito dá a alguém a inspiração de "falar em línguas" em alta voz. Suas palavras contém uma mensagem espiritual para um ou mais ouvintes. A mensagem permanece incompreensível, enquanto não for interpretada. A mensagem interpretada assume, regularmente, as características de uma profecia carismática, que, segundo S. Paulo, edifica, exorta e consola a assembléia. Autores há que, em vista de maior clareza, dão outro nome a esta forma de falar em  línguas. Chamam-na de "mensagem em línguas", ou ainda de "profecia em línguas". Em oposição ao "falar em línguas" durante a oração, este dom não está livremente à disposição da pessoa. Exige-se uma inspiração peculiar. Muitas vezes, ela está acompanhada de outra inspiração, a saber, num dos ouvintes que então "interpreta" a mensagem e a traduz em linguagem comum, para a comunidade. O dom de "falar mensagem em línguas" é um dom transitório manifestado vez ou outra nas reuniões de oração; e o Senhor pode servir-se ora deste, ora daquele, enquanto que o dom da interpretação geralmente é considerado permanente; é dom que pode ser pedido na oração.

3. Quando se deve orar em línguas? Só em atos próprios da RCC? Na TV para todos? Pode ser utilizada durante a Santa Missa, como parece ter acontecido na Oração dos fiéis nas missas de TV?

a) Sendo um dom do Espírito e um dom de oração, ele deveria ser permitido onde sempre é permitido orar. Nos atos próprios da RCC, o Documento 53, n. 25 da CNBB, já o levou em consideração.

b) Se a TV está transmitindo um ato próprio da RCC, não é possível "encenar" um comportamento que anule a identidade do Movimento. O exercício do carisma de orar em línguas é parte constitutiva da RCC. De nossa parte – os "carismáticos" – não temos de que nos envergonhar dessa prática, e nem temos nada a esconder. Somos assim. nossos Grupos de Oração estão sempre com as portas abertas, e qualquer um pode conferir lá o que somos e o que praticamos.

c) Na Santa Missa: Se são missas celebradas em atos específicos da RCC, parece-nos que sim, desde que se exercite essa oração nos momentos ditados pelo bom senso e pela orientação do celebrante, de modo respeitoso, profundamente oracional, não exibitório, especialmente como glorificação a Deus, como expressão de contrição, como petição, e como ação de graças.

d) A RCC tem clara consciência de que a Igreja, durante muito tempo, não se abriu à essa forma de se exercitar os carismas. Por isso ela sabe que, esse reavivamento de perfil pentecostal que se colocou em marcha no último século – especialmente a partir de Helena Guerra, que motivou Leão XIII a escrever uma Encíclica sobre o Espírito Santo, passando por João XXIII, que pediu um novo Pentecostes para a Igreja e a "renovação dos sinais e prodígios da aurora da Igreja", bem como pelo Concílio Vaticano II, onde Deus, providencialmente, lançou as bases e os fundamentos que tornaram possível o surgimento e a fundamentação do Movimento Pentecostal Católico, até João Paulo II, com sua Dominum et Vivificantem, e a inspirada exortação pronunciada na celebração de Pentecostes de 29 de maio de 2004, que dizia: "Desejo que a espiritualidade de Pentecostes se difunda na Igreja como um impulso renovado de oração, santidade, comunhão e anúncio. [...] Abram-se com docilidade aos dons do Espírito Santo! Recebam com gratidão e obediência os carismas que o Espírito não cessa de oferecer!" – precisa ser acolhido com abertura de espírito e destemor, mas também com bom senso, com humildade, com respeito pelas diferentes opções de engajamento na pastoral orgânica da Igreja, em absoluta adesão à doutrina da Igreja Católica, não escandalizando por falta de decoro litúrgico ou religioso, dentro da ordem, mas também não deixando de ser fiel à vocação que Deus nos faz, de, nesses tempos, contribuir para "revelar à Igreja aquilo que já lhe é próprio: sua dimensão carismática".

e) No rito do Sacramento da Crisma, ao final da Oração dos fiéis, o Bispo reza: "Ó Deus, que destes o Espírito Santo a vossos apóstolos e quisestes que eles e seus sucessores o transmitissem aos outros fiéis, ouvi com bondade a nossa oração e derramai nos corações de vossos filhos e filhas os dons que distribuístes outrora no início da pregação apostólica".

f) É de se esperar que, recebendo tais dons, possamos exercitá-los, pois "da aceitação desses carismas, mesmo dos mais simples, nasce em favor de cada um dos fiéis o direito e o dever de exercê-los para o bem dos homens e a edificação da Igreja e do mundo, na liberdade do Espírito Santo, que 'sopra onde quer' e ao mesmo tempo na comunhão com os irmãos em Cristo, sobretudo com seus pastores, a quem cabe julgar sobre a autenticidade e o uso dos carismas dentro da ordem, não por certo para extinguirem o Espírito, mas para provarem tudo e reterem o que é bom".

g) "Na lógica da originária doação donde derivam, os dons do Espírito Santo exigem que todos aqueles que os receberam os exerçam para o crescimento de toda a Igreja, como no-lo recorda o Concílio".

4 – Repouso no Espírito: O Documento 53, no número 65, aborda o tema e diz a respeito: "Em Assembléia, grupos de oração, retiros e outros reuniões evite-se a prática do assim chamado 'repouso no Espírito'. Essa prática exige maior aprofundamento, estudo e discernimento".

a) O Cardeal Suenens, que escreveu muito sobre a RCC e a apoiou, foi muito cauteloso em relação à prática do repouso no Espírito, recomendando reserva.

b) Pe. Robert De Grandis foi quem muito a divulgou aqui pelo Brasil e tem um livro sobre o assunto.

c) Pe. Antonello, da Arquidiocese de S. Paulo, pratica-o com bastante freqüência e também escreveu sobre o assunto.

d) Não há fundamentação bíblica consistente sobre ele, embora sua prática remonte aos grupos qualificados de entusiastas, especialmente nos grupos de reavivamento nos Estados Unidos entre os séculos XVII e XIX.

e) "O Espírito Santo, ao confiar à Igreja-Comunhão os diversos ministérios, enriquece-a com outros dons especiais, chamados carismas. Podem assumir as mais variadas formas, tanto como expressão da liberdade absoluta do Espírito que os distribui, como em resposta às múltiplas exigências da história da Igreja" . Em muitas ocasiões – especialmente quando praticado em atendimentos pessoais, em clima de oração –, de modo especial em atendimentos de oração por cura interior, essas manifestações se revelam perceptivelmente legítimas, sem componentes de perfil patológico, gerando em quem a experimenta profunda paz e bem estar, com conseqüente reavivamento ou novo compromisso, com os compromissos relativos à fé. Pe. Isaac Isaias Valle, por exemplo, de Porto Feliz, na Arquidiocese de Sorocaba, sacerdote muito estudioso e preparado doutrinariamente, atende as pessoas utilizando-se dessa prática.

f) Em muitas ocasiões – especialmente em grandes encontros – há um visível descontrole emocional da parte de muitos nos quais se manifesta tal fenômeno, chegando-se mesmo a identificáveis casos de histeria, seja por desequilíbrio de cunho psicológico. Como diz João Paulo II, "na verdade, a ação do Espírito Santo, que sopra onde quer, nem sempre é fácil de se descobrir e de se aceitar. Sabemos que Deus atua em todos os fiéis cristãos e estamos conscientes dos benefícios que provém dos carismas, tanto para os indivíduos como para toda a comunidade cristã. Todavia, também temos consciência da força do pecado e as confusões na vida dos fiéis e da comunidade."

g) Assim, não é oportuno incentivar tal prática. Mas há vezes em que, sem que ninguém estimule, ocorre tal manifestação. Então, surge a oportunidade para cumprir o que determina o Documento 53, buscando aprofundar o entendimento sobre a matéria, pela observação com um estudo do caso, até perguntando à pessoa como é que ela está se sentindo, se aquilo lhe gerou paz, se o seu é um histórico sem comprometimentos outros, etc, para chegar a um discernimento sobre as características que possam nos ajudar a identificar a legitimidade do repouso.

5 – Sobre as inspirações particulares: Em geral a liderança da RCC tem tido bastante bom senso no exercício dessas chamadas inspirações, ou moções. Junto com os dons da Palavra de Ciência e a Palavra de Sabedoria, a RCC se esmera em fazer uso do Dom do Discernimento Carismático. Podem ocorrer exageros e afoitas condutas? Claro que sim. Mas a realidade dos fatos logo "traz para a terra" aqueles espíritos mais atabalhoados, e que agem por impulsos meramente humanos, e de maneira até irresponsável. Na observância dos resultados práticos e dos frutos produzidos por tais inspirações é que a RCC busca aprender a deixar-se conduzir pelo Espírito, que – segundo a Apostolicam Actuositatem – distribui também aos leigos dons e carismas para capacitá-los a anunciar o Reino, com poder. É possível encontrar-se falsas moedas. Mas não vamos, com elas, jogar fora as legítimas, as verdadeiras. Em 2003, o Pontifício Conselho para os Leigos convidou a RCC a dar sua contribuição no Colóquio Internacional sobre a Oração para pedir de Deus a cura, realizado em Roma, sob os auspícios daquele Conselho, reconhecendo nela essa prudência.

II – Propostas:

a) Ao acompanhar a RCC, percebo que existe seriedade, busca de maior conhecimento teológico em suas lideranças e docilidade. Sugiro que a Comissão Episcopal de Doutrina promova um estudo sobre os Carismas e as práticas da RCC, com seus representantes. Pode até surgir uma nova e mais atualizada orientação pastoral.

b) Sugiro que os senhores bispos verifiquem em suas Dioceses os eventuais problemas, proporcionando uma orientação segura, através de um assistente diocesano que possa acompanhar de perto.

c) Nos Congressos Estaduais da RCC, seria muito oportuno que o Bispo do local em que o mesmo se realiza se fizesse presente com a apresentação de um tema de formação. Penso que "adotando a criança", poderemos orientar melhor e os membros da RCC não se sentirão marginalizados, mas membros vivos das Igrejas particulares.

Dom Alberto Taveira