terça-feira, 31 de março de 2015

O DIÁLOGO ENTRE CATÓLICOS E PENTECOSTAIS EVANGÉLICOS



Foto: Cardeal Jorge Mario Bergoglio (Papa Francisco) recebendo oração de Frei Raniero Cantalamessa, Matteo Calisi e alguns pastores pentecostais presentes no encontro do CRECES de 2006, em Buenos Aires, Argentina.

Autor: PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PROMOÇÃO DA UNIDADE DOS CRISTÃOS


Balanço de um ano marcado 
por novidades significativas e encorajadoras 

Pentecostais, vira-se a página!



Durante o último ano, em contratendência com as notícias que estamos habituados a ouvir relativas às relações entre católicos e pentecostais, realizaram-se eventos e houve declarações que indicam uma mudança. Eventos e declarações que talvez não encontrem divulgação suficiente nos meios de comunicação.

Diante do desafio do grande crescimento do Pentecostalismo, quer em termos numéricos (de 0 a 600 milhões em 100 anos), quer do ponto de vista da sua presença em quase todas as Igrejas e Comunidades eclesiais, as dificuldades relacionais entre pentecostais e católicos no mundo inteiro e, de maneira particular, no continente latino-americano, são muito conhecidas por todos. Por conseguinte, é ainda mais significativo o facto de que, pela primeira vez, entre os observadores da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, estava presente um cristão pentecostal.

Na mesma ocasião, na saudação dirigida aos Bispos por todos os observadores evangélicos, três afirmações merecem ser mencionadas. A primeira refere-se ao Santo Padre: "Desde o início desta Conferência declararam os evangélicos latino-americanos (75% dos quais são pentecostais), com um tom novo e surpreendente, sentimo-nos estimulados e desafiados pelo convite do Papa Bento XVI a fundar na leitura e no conhecimento da Palavra de Deus o novo despertar missionário do qual a nossa América Latina e o Caribe têm necessidade".

Sobre o papel dos católicos no continente, recordando também que, neste processo, muitos fiéis evangélicos anunciaram a Palavra de Deus, alguns até ao martírio, os observadores afirmaram: "Não podemos deixar de reconhecer o testemunho e a preeminência da Igreja Católica romana na evangelização da nossa América. [A Igreja Católica] guiada pelo Espírito de Deus e pela sua Palavra, além das ambiguidades das circunstâncias históricas gerou uma fé rica em diversas expressões religiosas que fizeram com que a mensagem de Cristo criasse raízes no continente". Enfim, os evangélicos convidam os católicos a enfrentar juntos e dizem-se dispostos a realizar todos os esforços a fim de superar a competitividade e a agressividade com a finalidade de realizar a vocação de discípulos e missionários de Jesus Cristo.

Noutro contexto, nas conclusões do Seminário sobre o Ecumenismo para os Bispos do Cone Sul organizado pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos na Argentina, os participantes, após terem estudado o fenómeno pentecostal e debatido sobre a actual situação entre os cristãos na região, declararam: "Cremos que, guiados pelo Espírito Santo, devemos ir ao encontro dos nossos irmãos pentecostais, valorizando esta corrente de graça e sem extinguir o Espírito: com amor, prudência e discernimento; superando a atitude defensiva, pois o temor não é fruto do Espírito".

O mesmo espírito de abertura e, ao mesmo tempo de firmeza, transparência no discurso do Papa Bento XVI durante a sua visita ao Brasil. Com efeito, o Santo Padre recordava que para realizar a vocação ecuménica no meio do crescente pluralismo religioso e num ambiente nem sempre favorável, para os católicos "vale sempre o princípio do amor fraterno e da busca de compreensão e de aproximação recíprocas; mas também a defesa da fé do nosso povo...".

Contudo, quem são os pentecostais? Quais são os seus pontos fortes e os seus pontos frágeis? Qual é a sua identidade, ainda em evolução? E o que nos podem oferecer para superar as nossas fraquezas como cristãos e reforçar a nossa própria fé e identidade? Devemos admitir que na presença cada vez mais consistente destes grupos não corresponde um conhecimento adequado por parte dos católicos. Portanto, é oportuno reflectir, de modo positivo e crítico, inclusive sobre o que a relação com os pentecostais mudou e está a mudar na nossa identidade confessional e decidir sobre o que fazer para nos manter fiéis à nossa tradição.

O crescimento do Pentecostalismo tanto para criação de novas denominações Pentecostais clássicos (a partir de 1906 em diante) e Pentecostais não-denominacionais (a partir de 1980) como mediante a sua incorporação no interior das diversas tradições cristãs Pentecostais denominacionais (a partir de 1950 em diante), gerou uma situação de recíproca influência e de interação entre as várias comunidades cristãs. Em diversos continentes, há comunidades evangélicas e protestantes que, embora conservando os seus nomes originais, conservam muito pouco da sua tradição eclesial originária depois de terem adoptado a forma pentecostal. Outras dividiram-se em duas ou mais fracções opostas: uma fiel à tradição eclesial originária, outra que privilegia o estilo pentecostal que "dilui" com frequência a tradição precedente. A outra face da moeda é a existência de uma clara influência por parte das diversas tradições das igrejas históricas sobre o pentecostalismo, uma influência que deve ser ulteriormente analisada e, possivelmente, encorajada.

Tarefa urgente para os que se dedicam à pastoral e para todos os baptizados, é redescobrir os tesouros da identidade católica. A melhor forma de contacto é estar sempre prontos para partilhar com os outros cristãos as nossas convicções e experiências de fé; a nossa tradição; a nossa espiritualidade e a rica diversidade devocional, com coração aberto. Só assim podemos falar verdadeiramente de conhecimento recíproco, diálogo, colaboração e oração comum. Neste sentido, vale a pena citar o que menciona o documento final de Aparecida: "De acordo com a nossa experiência pastoral, muitas vezes as pessoas sinceras que abandonam a nossa Igreja não o fazem por aquilo que os grupos "não católicos" crêem, mas fundamentalmente por aquilo que eles vivem; não por motivações estreitamente dogmáticas mas pastorais; não por problemas teológicos mas metodológicos no interior da nossa Igreja. Na realidade, muitos dos que passam para outros grupos religiosos não querem abandonar a nossa Igreja, mas buscam sinceramente Deus".

Entre os aspectos positivos da mudança gerada dentro do cristianismo pelo surgimento do Pentecostalismo, podemos mencionar a descoberta do papel central do Espírito Santo, o facto de que a conversão pessoal a Jesus Cristo seja requerida de maneira explícita e continuativa durante o período da vida de cada cristão; a ênfase dada à oração e ao poder da oração; a descoberta dos carismas e dos dons espirituais como realidade activa e necessária na vida de cada fiel. Ao contrário, é certamente negativo o facto de que o pentecostalismo e os pentecostais realcem a sua experiência e espiritualidade como a única produzida directamente pelo próprio Deus; por conseguinte, não surpreende que não estejamos dispostos a reconhecer a outras experiências cristãs na Igreja a mesma importância e o mesmo papel. Para eles, a plenitude do ser cristão é alcançada com a experiência do "Baptismo no Espírito"; portanto, a diferenciação entre cristãos e pentecostais depende do possuir ou não o Espírito Santo de maneira plena, isto é, assim como está descrito no segundo capítulo dos Actos dos Apóstolos. E por conseguinte, para eles, "um cristão nem sempre é pentecostal, um pentecostal é sempre um verdadeiro cristão".

Foram realizados muitos esforços durantes esses anos a fim de compreender a realidade pentecostal e esclarecer, com a comparação, a tradição católica. O diálogo internacional católico pentecostal, iniciado em 1972 e que chegou à sua quinta fase, também em contratendência com quanto se verificou em alguns lugares, concentrou os seus debates acerca do tornar-se cristãos, servindo-se dos testemunhos bíblicos e patrísticos. 
O relatório On Becoming a Christian: Insights from Scripture and the Patristic Writings. With Some Contemporary Reflections, que será publicado proximamente, é uma verdadeira novidade, sobretudo porque é a primeira vez que católicos e pentecostais estudam juntos os Padres da Igreja e os citam amplamente no documento. Por parte dos Pentecostais não-denominacionais, acolhendo uma sua solicitação e depois de um processo de preparação de vários anos, o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos realizará conversações preliminares com um grupo dos seus líderes, em Abril de 2008. Tal iniciativa pretende definir a situação acerca da sua identidade eclesial e verificar a possibilidade de estabelecer um processo de aproximação com os católicos.

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